Em cartaz na peça 'Três mulheres altas', Fernanda Nobre reflete sobre feminismo: 'há uma pressão, desde a barriga da mãe'

Em último fim de semana da temporada, foram acrescentadas duas sessões extras “De verdade, o momento mais feliz da vida é chegar ao fim, ao fim de tudo. Ao ponto em que você pode pensar sobre si mesma como uma terceira pessoa sem parecer louca.” O trecho, dito pela personagem A, já na casa dos 90 anos, no final da peça “Três Mulheres Altas”, resume a proposta do texto de Edward Albee, vencedor do Prêmio Pulitzer. Suely Franco, Débora Evelyn e Fernanda Nobre dão vida às personagens A, B e C, respectivamente, na montagem em cartaz no Teatro Copacabana Palace, que encerra temporada neste fim de semana com mais duas sessões extras — sábado, às 15h, e domingo, às 17h. ‘Uma babá quase perfeita’: Eduardo Sterblitch estrela musical em papel que foi de Robin Williams 'Um jardim para Tchekhov': Maria Padilha estrela peça que bebe na fonte do autor russo para tratar de intolerância — Pra mim faz todo sentido (a frase)! É só relaxar — brinca Suely. — O pessoal reflete muito durante a peça. Mas não só os mais velhos, os novos também. Conforme o espetáculo vai seguindo, eles ficam pensando muito junto. Só que de maneiras diferentes. O texto, que passou pelos palcos brasileiros pela primeira vez em 1995 — um ano após a estreia na Broadway, com Beatriz Segall, Nathalia Timberg e Marisa Orth no elenco— , estreou a nova versão em 2022, sob direção de Fernando Philbert. A montagem rendeu o prêmio APTR de Melhor Atriz para Débora Evelyn. O diretor conta que, quando recebeu o convite da produtora WB, foi atravessado pela reflexão sobre a passagem do tempo na vida, temática abordada na peça. Para ele, isso também toca o público, o que reflete na compreensão individual. — É no olhar do espectador que o teatro acontece. Esta peça sempre será atual e irá merecer voltar ao palco. Hoje, se fala muito do que realmente traz sentido para nossas escolhas na vida: o amor, o trabalho, o saber viver. “Três Mulheres Altas” é uma produção que fala do tempo e coloca diante da gente a metáfora de um balanço da vida. Acredito que, daqui a 200 anos, este texto terá o que dizer para quem estiver na plateia. Para a nova temporada de 2024, a atriz Fernanda Nobre assumiu o papel de C, que na montagem de 2022 foi interpretado pela amiga Nathalia Dill. A atriz e o diretor já tinham trabalhado juntos na peça “O corpo da mulher como campo de batalha”, em que a Fernanda foi indicada ao prêmio Shell. Na substituição de “Três Mulheres Altas”, a escolha dialogou também com o momento de vida pelo qual ela está passando. A atriz faz mestrado sobre opressão feminina na PUC-Rio e conta que, quando começou a ensaiar, também foi impactada pelos temas abordados. Principalmente, sobre o aspecto de como cada idade encara a velhice e o avançar da vida. Para Philbert, Fernanda leva à cena, não só seu talento, mas "um entendimento dos desafios femininos na busca por respeito e liberdade nesta sociedade estruturalmente patriarcal". Fernanda Nobre em cena na peça "Três mulheres altas" Divulgação — É um assunto que me comove muito: o tempo. Significa maturidade, sabedoria, experiências vividas. Mas ele é o grande vilão do feminino. A gente lida com o tempo de uma maneira muito ruim na nossa cultura, tem medo dele, tenta driblar, não quer que chegue. Sendo que ele é o grande aliado da existência. A minha personagem tem um retrato muito forte cultural nisso, de como a gente não é criada para olhar para a velhice com respeito. O questionamento sobre o quanto as mulheres são realmente livres para escolherem seus caminhos é outro tema que se entrelaça com o texto e o estudo acadêmico de Fernanda. — Essa peça é dos anos 1990. Mas, mesmo hoje, estamos realmente escolhendo ou achando que está escolhendo? Há uma pressão, algo já estabelecido, desde o momento em que a gente está na barriga das nossas mães. A gente nasce, colocam um furo na nossa orelha, dão roupa rosa, botam a gente em determinado esporte. Já está estabelecido — questiona a atriz, que se inclui também como parte desse contexto, e conclui: — São perguntas, mas eu acho que o questionamento já é um primeiro passo. Fernanda encara como um grande marco a chegada do feminismo em sua vida. Esse mergulho começou entre 2013 e 2015 e a fez questionar o sentido e os por quês de ocupar o espaço que está inserida. Para a atriz, é um privilégio viver a fase adulta nesse momento histórico: — As coisas estão vindo à tona e não vinham. Não se falava sobre isso. A gente não tinha vocabulário para perceber o que estava nos acontecendo. Hoje temos, conseguimos falar. Eu acho que estamos dentro de um processo de uma grande mudança, e mudanças sociais são demoradas. Apesar de serem bem mais rápidas do que já foram, ainda é um processo. Estamos nele, atuantes e pensadores. O mergulho no estudo do feminismo foi profundo e se desdobrou em obras escritas. Além da tese, a atriz planeja lançar um livro — com previsão para o ano que vem — a convite da editora Record, ainda em processo de construção. — É sobre a pessoa feminina, mas me co

Oct 4, 2024 - 23:59
 0  0
Em cartaz na peça 'Três mulheres altas', Fernanda Nobre reflete sobre feminismo: 'há uma pressão, desde a barriga da mãe'

Em último fim de semana da temporada, foram acrescentadas duas sessões extras “De verdade, o momento mais feliz da vida é chegar ao fim, ao fim de tudo. Ao ponto em que você pode pensar sobre si mesma como uma terceira pessoa sem parecer louca.” O trecho, dito pela personagem A, já na casa dos 90 anos, no final da peça “Três Mulheres Altas”, resume a proposta do texto de Edward Albee, vencedor do Prêmio Pulitzer. Suely Franco, Débora Evelyn e Fernanda Nobre dão vida às personagens A, B e C, respectivamente, na montagem em cartaz no Teatro Copacabana Palace, que encerra temporada neste fim de semana com mais duas sessões extras — sábado, às 15h, e domingo, às 17h. ‘Uma babá quase perfeita’: Eduardo Sterblitch estrela musical em papel que foi de Robin Williams 'Um jardim para Tchekhov': Maria Padilha estrela peça que bebe na fonte do autor russo para tratar de intolerância — Pra mim faz todo sentido (a frase)! É só relaxar — brinca Suely. — O pessoal reflete muito durante a peça. Mas não só os mais velhos, os novos também. Conforme o espetáculo vai seguindo, eles ficam pensando muito junto. Só que de maneiras diferentes. O texto, que passou pelos palcos brasileiros pela primeira vez em 1995 — um ano após a estreia na Broadway, com Beatriz Segall, Nathalia Timberg e Marisa Orth no elenco— , estreou a nova versão em 2022, sob direção de Fernando Philbert. A montagem rendeu o prêmio APTR de Melhor Atriz para Débora Evelyn. O diretor conta que, quando recebeu o convite da produtora WB, foi atravessado pela reflexão sobre a passagem do tempo na vida, temática abordada na peça. Para ele, isso também toca o público, o que reflete na compreensão individual. — É no olhar do espectador que o teatro acontece. Esta peça sempre será atual e irá merecer voltar ao palco. Hoje, se fala muito do que realmente traz sentido para nossas escolhas na vida: o amor, o trabalho, o saber viver. “Três Mulheres Altas” é uma produção que fala do tempo e coloca diante da gente a metáfora de um balanço da vida. Acredito que, daqui a 200 anos, este texto terá o que dizer para quem estiver na plateia. Para a nova temporada de 2024, a atriz Fernanda Nobre assumiu o papel de C, que na montagem de 2022 foi interpretado pela amiga Nathalia Dill. A atriz e o diretor já tinham trabalhado juntos na peça “O corpo da mulher como campo de batalha”, em que a Fernanda foi indicada ao prêmio Shell. Na substituição de “Três Mulheres Altas”, a escolha dialogou também com o momento de vida pelo qual ela está passando. A atriz faz mestrado sobre opressão feminina na PUC-Rio e conta que, quando começou a ensaiar, também foi impactada pelos temas abordados. Principalmente, sobre o aspecto de como cada idade encara a velhice e o avançar da vida. Para Philbert, Fernanda leva à cena, não só seu talento, mas "um entendimento dos desafios femininos na busca por respeito e liberdade nesta sociedade estruturalmente patriarcal". Fernanda Nobre em cena na peça "Três mulheres altas" Divulgação — É um assunto que me comove muito: o tempo. Significa maturidade, sabedoria, experiências vividas. Mas ele é o grande vilão do feminino. A gente lida com o tempo de uma maneira muito ruim na nossa cultura, tem medo dele, tenta driblar, não quer que chegue. Sendo que ele é o grande aliado da existência. A minha personagem tem um retrato muito forte cultural nisso, de como a gente não é criada para olhar para a velhice com respeito. O questionamento sobre o quanto as mulheres são realmente livres para escolherem seus caminhos é outro tema que se entrelaça com o texto e o estudo acadêmico de Fernanda. — Essa peça é dos anos 1990. Mas, mesmo hoje, estamos realmente escolhendo ou achando que está escolhendo? Há uma pressão, algo já estabelecido, desde o momento em que a gente está na barriga das nossas mães. A gente nasce, colocam um furo na nossa orelha, dão roupa rosa, botam a gente em determinado esporte. Já está estabelecido — questiona a atriz, que se inclui também como parte desse contexto, e conclui: — São perguntas, mas eu acho que o questionamento já é um primeiro passo. Fernanda encara como um grande marco a chegada do feminismo em sua vida. Esse mergulho começou entre 2013 e 2015 e a fez questionar o sentido e os por quês de ocupar o espaço que está inserida. Para a atriz, é um privilégio viver a fase adulta nesse momento histórico: — As coisas estão vindo à tona e não vinham. Não se falava sobre isso. A gente não tinha vocabulário para perceber o que estava nos acontecendo. Hoje temos, conseguimos falar. Eu acho que estamos dentro de um processo de uma grande mudança, e mudanças sociais são demoradas. Apesar de serem bem mais rápidas do que já foram, ainda é um processo. Estamos nele, atuantes e pensadores. O mergulho no estudo do feminismo foi profundo e se desdobrou em obras escritas. Além da tese, a atriz planeja lançar um livro — com previsão para o ano que vem — a convite da editora Record, ainda em processo de construção. — É sobre a pessoa feminina, mas me colocando em primeira pessoa, falando dos meus estudos e das minhas descobertas — explica a atriz. Serviço: Teatro Copacabana Palace. Sex, às 19h30. Sáb, às 15h e às 19h30. Dom, às 17h e 20h. Até domingo (6).

Qual é a sua reação?

like

dislike

love

funny

angry

sad

wow