De 'visionário' dono de casa de rock a homem-bomba: autor de ataque radicalizou discurso após as eleições de 2022
Empresário do ramo do entretenimento passou a se interessar pela política com a chegada de Bolsonaro à Presidência Autor do ataque com explosivos direcionado ao Supremo Tribunal Federal (STF), Francisco Wanderley Luiz, de 59 anos, era conhecido em Rio do Sul (SC), cidade de 72 mil habitantes a 200 quilômetros da capital catarinense, como um empresário do ramo do entretenimento. Quem conviveu com ele afirma que seu interesse pela política coincidiu com a chegada de Jair Bolsonaro à Presidência, em 2018. Já o discurso radical, que incluía ameaças a instituições, passou a fazer parte de seu repertório após a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva em 2022. Desde então, bandeiras do Brasil, referências militares e ataques ao comunismo passaram a dominar suas redes sociais. 'Querem perdoar sem sequer condenar': Presidente do STF diz que explosões reforçam necessidade de responsabilização Vídeo: Imagens da Câmara mostram momento da explosão de bombas em carro O GLOBO ouviu parentes, amigos e vizinhos de Francisco Luiz, conhecido como “França”, sobre o processo de radicalização que o transformou de um empresário bem-sucedido do interior catarinense no “homem-bomba” da Praça dos Três Poderes, em Brasília. Francisco é de uma família conhecida de comerciantes da cidade de Rio do Sul. Desde a juventude, empreendia na área de eventos e shows, mas ficou mais conhecido quando inaugurou, na década de 1980, diversas discotecas na cidade. Bar de rock Um dos frequentadores era o deputado Jorge Goetten (Republicanos-SC), que se mudou para o município catarinense aos 13 anos. Dono de uma lanchonete na cidade, o parlamentar conta que considerava Francisco “um visionário”, com grande tino empreendedor. Um de seus últimos negócios foi uma casa onde tocava rock. Amigos e familiares contam que o comerciante nunca foi de falar de política e não tinha interesse pelo que acontecia em Brasília, mas que isso começou a mudar a partir de 2018, com a eleição de Bolsonaro. Em 2020, se filiou ao PL, atual partido do ex-presidente, para tentar uma vaga de vereador, mas conseguiu apenas 98 votos. “Paz, amor, generosidade, sinceridade, perdão e humildade” era uma das mensagens disseminadas por ele durante sua campanha. — Ele entrou na política, foi candidato a vereador. E com a bandeira do Bolsonaro, sempre. Acredito que (a eleição de Bolsonaro) deva ter desencadeado esse lado político nessa época. Nunca tinha visto envolvimento dele antes — disse Eduardo Marzall, ex-presidente do PL de Rio do Sul. Marzall contou conhecer Francisco há 40 anos, desde quando começou a frequentar uma discoteca que ele e dois irmãos possuíam na cidade. O ex-dirigente partidário afirma que o amigo nunca demonstrou comportamento que indicasse ser capaz de um ato extremo, como o ataque a bombas ao STF. — Ele era daqueles caras que tudo o que o Bolsonaro falava era amém. Mas em momento nenhum (demonstrou ser) uma pessoa que faz uma atitude errada como ele fez — contou Marzall. Familiares ouvidos pela reportagem afirmam que tudo mudou em 2022, após a derrota de Bolsonaro nas urnas. Foi nessa época que, na cidade natal, passou a frequentar manifestações golpistas que antecederam as invasões do 8 de Janeiro. Em uma declaração gravada em vídeo pela Polícia Federal, a ex-mulher dele, identificada apenas como Daiane, afirmou que desde então Francisco “só falava de política” e estava obcecado com a ideia de matar o ministro Alexandre de Moraes, do STF. Segundo ela, o plano era assassinar o magistrado e “quem estivesse perto” no momento. Daiane disse ainda aos agentes da PF em Santa Catarina que Francisco chegou a compartilhar com ela pesquisas no Google para planejar o atentado que tentaria executar na.quinta-feira Mensagens postadas por Francisco nas redes sociais evidenciavam sua guinada em direção ao extremismo. Ele chegou a visitar o Supremo já com planos para o ataque, em agosto de 2024, quando postou uma foto dentro do plenário da Corte: “Deixaram a raposa entrar dentro do galinheiro (chiqueiro) ou não sabem o tamanho das presas ou é burrice mesmo. Provérbios 16:18 (A soberba precede a queda)”, escreveu na legenda. Nas redes sociais, publicava prints de mensagens de WhatsApp enviadas por ele mesmo nas quais citava que o Brasil já era “um país socialista e comunista” e que iria “entregar a sua vida” para que “as crianças cresçam com liberdade”. Em uma postagem, reproduziu teoria conspiratória anticomunista ligada ao grupo de extrema direita QAnon. Mensagem no espelho Desde o ano passado, Francisco passou a viajar com frequência a Brasília. Para se hospedar na cidade, alugou uma quitinete na Ceilândia, região administrativa da capital federal, a cerca de 30 quilômetros da Praça dos Três Poderes. No espelho do banheiro do imóvel de 25 metros quadrados, deixou uma mensagem escrita com batom vermelho: “Debora Rodrigues. Por favor, não desperdice o batom. Isso é para deixar as mulheres bonitas, estátua de merda se usa TNT”, numa referência à golpista presa por pic
Empresário do ramo do entretenimento passou a se interessar pela política com a chegada de Bolsonaro à Presidência Autor do ataque com explosivos direcionado ao Supremo Tribunal Federal (STF), Francisco Wanderley Luiz, de 59 anos, era conhecido em Rio do Sul (SC), cidade de 72 mil habitantes a 200 quilômetros da capital catarinense, como um empresário do ramo do entretenimento. Quem conviveu com ele afirma que seu interesse pela política coincidiu com a chegada de Jair Bolsonaro à Presidência, em 2018. Já o discurso radical, que incluía ameaças a instituições, passou a fazer parte de seu repertório após a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva em 2022. Desde então, bandeiras do Brasil, referências militares e ataques ao comunismo passaram a dominar suas redes sociais. 'Querem perdoar sem sequer condenar': Presidente do STF diz que explosões reforçam necessidade de responsabilização Vídeo: Imagens da Câmara mostram momento da explosão de bombas em carro O GLOBO ouviu parentes, amigos e vizinhos de Francisco Luiz, conhecido como “França”, sobre o processo de radicalização que o transformou de um empresário bem-sucedido do interior catarinense no “homem-bomba” da Praça dos Três Poderes, em Brasília. Francisco é de uma família conhecida de comerciantes da cidade de Rio do Sul. Desde a juventude, empreendia na área de eventos e shows, mas ficou mais conhecido quando inaugurou, na década de 1980, diversas discotecas na cidade. Bar de rock Um dos frequentadores era o deputado Jorge Goetten (Republicanos-SC), que se mudou para o município catarinense aos 13 anos. Dono de uma lanchonete na cidade, o parlamentar conta que considerava Francisco “um visionário”, com grande tino empreendedor. Um de seus últimos negócios foi uma casa onde tocava rock. Amigos e familiares contam que o comerciante nunca foi de falar de política e não tinha interesse pelo que acontecia em Brasília, mas que isso começou a mudar a partir de 2018, com a eleição de Bolsonaro. Em 2020, se filiou ao PL, atual partido do ex-presidente, para tentar uma vaga de vereador, mas conseguiu apenas 98 votos. “Paz, amor, generosidade, sinceridade, perdão e humildade” era uma das mensagens disseminadas por ele durante sua campanha. — Ele entrou na política, foi candidato a vereador. E com a bandeira do Bolsonaro, sempre. Acredito que (a eleição de Bolsonaro) deva ter desencadeado esse lado político nessa época. Nunca tinha visto envolvimento dele antes — disse Eduardo Marzall, ex-presidente do PL de Rio do Sul. Marzall contou conhecer Francisco há 40 anos, desde quando começou a frequentar uma discoteca que ele e dois irmãos possuíam na cidade. O ex-dirigente partidário afirma que o amigo nunca demonstrou comportamento que indicasse ser capaz de um ato extremo, como o ataque a bombas ao STF. — Ele era daqueles caras que tudo o que o Bolsonaro falava era amém. Mas em momento nenhum (demonstrou ser) uma pessoa que faz uma atitude errada como ele fez — contou Marzall. Familiares ouvidos pela reportagem afirmam que tudo mudou em 2022, após a derrota de Bolsonaro nas urnas. Foi nessa época que, na cidade natal, passou a frequentar manifestações golpistas que antecederam as invasões do 8 de Janeiro. Em uma declaração gravada em vídeo pela Polícia Federal, a ex-mulher dele, identificada apenas como Daiane, afirmou que desde então Francisco “só falava de política” e estava obcecado com a ideia de matar o ministro Alexandre de Moraes, do STF. Segundo ela, o plano era assassinar o magistrado e “quem estivesse perto” no momento. Daiane disse ainda aos agentes da PF em Santa Catarina que Francisco chegou a compartilhar com ela pesquisas no Google para planejar o atentado que tentaria executar na.quinta-feira Mensagens postadas por Francisco nas redes sociais evidenciavam sua guinada em direção ao extremismo. Ele chegou a visitar o Supremo já com planos para o ataque, em agosto de 2024, quando postou uma foto dentro do plenário da Corte: “Deixaram a raposa entrar dentro do galinheiro (chiqueiro) ou não sabem o tamanho das presas ou é burrice mesmo. Provérbios 16:18 (A soberba precede a queda)”, escreveu na legenda. Nas redes sociais, publicava prints de mensagens de WhatsApp enviadas por ele mesmo nas quais citava que o Brasil já era “um país socialista e comunista” e que iria “entregar a sua vida” para que “as crianças cresçam com liberdade”. Em uma postagem, reproduziu teoria conspiratória anticomunista ligada ao grupo de extrema direita QAnon. Mensagem no espelho Desde o ano passado, Francisco passou a viajar com frequência a Brasília. Para se hospedar na cidade, alugou uma quitinete na Ceilândia, região administrativa da capital federal, a cerca de 30 quilômetros da Praça dos Três Poderes. No espelho do banheiro do imóvel de 25 metros quadrados, deixou uma mensagem escrita com batom vermelho: “Debora Rodrigues. Por favor, não desperdice o batom. Isso é para deixar as mulheres bonitas, estátua de merda se usa TNT”, numa referência à golpista presa por pichar a estátua da Justiça durante os atos de 8 de janeiro. Na ocasião, ela pichou “perdeu, mané” na estátua, em referência a uma frase dita pelo ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente do STF. Além do recado, Francisco deixou duas bombas no local, que foram desativadas pela PM. Vizinha de porta, Gleide Silva diz que conhecia Francisco desde o início do ano passado. Segundo ela, o homem-bomba era uma pessoa “normal, falante e prestativa”. — Ele veio pela primeira vez e morou quatro meses. Aí ele voltou para Santa Catarina. Ficou lá um ano e pouco. Agora, no mês de agosto, ele veio de novo — relatou ela. Em uma das visitas a Brasília, Francisco visitou o deputado Jorge Goetten em seu gabinete na Câmara, em agosto de 2023. O parlamentar afirma que na ocasião estranhou o comportamento do amigo. — Me chamou atenção porque ele falava muito da separação da mulher dele. Eu falei para o pessoal do gabinete: “Esse França não é o França que eu conhecia”. Ele me pareceu com a saúde emocional abalada. Estranhei essa atitude dele — afirmou Goetten. Imagens do circuito interno da Câmara mostram que Francisco voltou à Câmara na quarta-feira, cerca de 11 horas antes de morrer ao explodir um artefato. A assessoria da Casa confirma que ele entrou no Anexo IV às 8h15, foi ao banheiro, e saiu do local na sequência. Às 19h30, atirou duas bombas em direção à sede do STF e, em seguida, explodiu uma terceira junto à sua cabeça.
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