A banana de US$ 6,2 milhões: O que o comprador realmente leva? Ele vai comer a banana? O que é arte conceitual?

Banana presa com fita adesiva, obra conceitual de Maurizio Cattelan, foi vendida por US$ 6,2 milhões em leilão da Sotheby's para milionário chinês de criptomoedas, levantando várias questões entre o público Não é apenas uma banana. É uma banana com uma história. O espetáculo na noite de quarta-feira, quando um leiloeiro da Sotheby's, em Nova York, alertou os compradores para não deixarem escapar a obra de de Maurizio Cattelan, terminou com uma banana presa com fita adesiva sendo vendida por espantosos US$ 6,2 milhões. Dieta de Virginia Fonseca: Banana com whey, 10 ovos por dia e 'nada de doce' Justin Sun, criador de uma criptomoeda, deu o lance vencedor a partir de Hong Kong. O empresário chinês agora poderá acrescentar a obra de arte conceitual de Cattelan, intitulada "Comedian", à coleção peculiar que acumulou nos últimos anos, que inclui uma escultura de Alberto Giacometti, uma pintura de Pablo Picasso e um token não fungível muito caro, ou NFT, de uma pedra de estimação. Mas vencer o leilão é apenas o começo das negociações que ocorrerão ao longo do próximo mês ou mais (um comprador costuma ter 30 dias para pagar, e nesse período a banana inevitavelmente vai apodrecer). Em uma entrevista por telefone, Sun disse que pretende pagar pela banana com sua própria criptomoeda, mas a Sotheby's só deve aceitar formas mais populares de pagamento digital, como bitcoin ou ethereum. Abaixo, respondemos seis perguntas que podem ter surgido em sua cabeça, ao ver ultra-ricos oferecendo milhões por um pedaço de fruta. O que ele realmente leva por esses US$ 6,2 milhões? Magnata cripto Justin Sun arrematou obra 'banana colada com fita adesiva' AFP//MelfarraTron/Wikimedia Commons O comprador disse que pretendia "comer a banana como parte dessa experiência artística única", mas é improvável que a banana real apresentada na Sotheby's sobreviva à viagem de avião para Hong Kong, mesmo refrigerada. Na verdade, a banana com fita adesiva é apenas a representação física da obra de arte conceitual que Cattelan fez para a edição de 2019 da Art Basel Miami Beach, onde foi originalmente vendida por algo entre US$ 120 mil e US$ 150 mil. Obras de arte conceituais são essencialmente ideias. O que o artista normalmente vende é um certificado de autenticidade e uma lista de instruções para os proprietários sobre como manter ou recriar suas compras. Cattelan fez três edições de “Comedian”. Assim que seu pagamento for compensado com a casa de leilões, Sun provavelmente herdará a lista surpreendentemente detalhada de 14 páginas de instruções com diagramas que Cattelan forneceu a outros colecionadores da banana, incluindo o Museu Solomon R. Guggenheim, que recebeu uma versão de um doador anônimo alguns anos atrás. As instruções incluem diagramas e uma explicação de como a banana deve ser instalada e exibida, incluindo permissão para substituir a banana quando ela apodrecer. Lena Stringari, a conservadora-chefe do Guggenheim na época, disse que as instruções são fáceis de seguir: elas sugerem trocar a banana a cada sete a 10 dias e fixá-la a cerca de 5 pés e 9 polegadas acima do solo. Um novo rolo de fita adesiva prateada está incluído. O que Cattelan ganha com essa venda? Nada! A não ser muita atenção. Cattelan já recebeu uma taxa, não revelada, quando vendeu a banana originalmente (a obra é o nº 2 das três edições criadas pelo artista). O comprador então consignou a banana para o leilão da Sotheby's. Embora os artistas recebam uma porcentagem das revendas em países como Reino Unido, França e Itália, esse não é o caso nos Estados Unidos. Nos últimos anos, os artistas recorreram a ferramentas de blockchain, como NFTs, para manter royalties de revenda em seus contratos. Casas de leilão como a Sotheby's honraram esses contratos, mesmo quando o mercado NFT as abandonou. Mas obras de arte — sejam elas tradicionais ou não convencionais, como “Comedian” — não têm disposições que exijam que uma parte do pagamento seja redirecionada ao artista. “Casas de leilão e colecionadores colhem os benefícios, enquanto o criador, que faz o próprio objeto que impulsiona o mercado, é deixado de fora”, disse Cattelan em uma entrevista antes da venda. “NFTs oferecem royalties a cada revenda. Não parece estranho que o mercado de arte tradicional não tenha adotado um sistema semelhante?” Por que alguém pagaria US$ 6,2 milhões por uma banana? Obra 'Comedian', de Maurizio Castellan, em exposição na Sotheby's, em Nova York TIMOTHY A. CLARY / AFP De acordo com Sun, “Esta não é apenas uma obra de arte; representa um fenômeno cultural que une os mundos da arte, dos memes e da comunidade de criptomoedas. Acredito que esta peça vá inspirar mais pensamento e discussão no futuro e se tornará parte da história.” De forma mais geral, participar do mercado de arte dá aos ultrarricos influência cultural, autorrealização e um senso de comunidade. Construir uma coleção muitas vezes torna-se o primeiro passo para ingressar nos conselhos de museus e grupos influentes sem fins lucra

Nov 22, 2024 - 11:53
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A banana de US$ 6,2 milhões: O que o comprador realmente leva? Ele vai comer a banana? O que é arte conceitual?

Banana presa com fita adesiva, obra conceitual de Maurizio Cattelan, foi vendida por US$ 6,2 milhões em leilão da Sotheby's para milionário chinês de criptomoedas, levantando várias questões entre o público Não é apenas uma banana. É uma banana com uma história. O espetáculo na noite de quarta-feira, quando um leiloeiro da Sotheby's, em Nova York, alertou os compradores para não deixarem escapar a obra de de Maurizio Cattelan, terminou com uma banana presa com fita adesiva sendo vendida por espantosos US$ 6,2 milhões. Dieta de Virginia Fonseca: Banana com whey, 10 ovos por dia e 'nada de doce' Justin Sun, criador de uma criptomoeda, deu o lance vencedor a partir de Hong Kong. O empresário chinês agora poderá acrescentar a obra de arte conceitual de Cattelan, intitulada "Comedian", à coleção peculiar que acumulou nos últimos anos, que inclui uma escultura de Alberto Giacometti, uma pintura de Pablo Picasso e um token não fungível muito caro, ou NFT, de uma pedra de estimação. Mas vencer o leilão é apenas o começo das negociações que ocorrerão ao longo do próximo mês ou mais (um comprador costuma ter 30 dias para pagar, e nesse período a banana inevitavelmente vai apodrecer). Em uma entrevista por telefone, Sun disse que pretende pagar pela banana com sua própria criptomoeda, mas a Sotheby's só deve aceitar formas mais populares de pagamento digital, como bitcoin ou ethereum. Abaixo, respondemos seis perguntas que podem ter surgido em sua cabeça, ao ver ultra-ricos oferecendo milhões por um pedaço de fruta. O que ele realmente leva por esses US$ 6,2 milhões? Magnata cripto Justin Sun arrematou obra 'banana colada com fita adesiva' AFP//MelfarraTron/Wikimedia Commons O comprador disse que pretendia "comer a banana como parte dessa experiência artística única", mas é improvável que a banana real apresentada na Sotheby's sobreviva à viagem de avião para Hong Kong, mesmo refrigerada. Na verdade, a banana com fita adesiva é apenas a representação física da obra de arte conceitual que Cattelan fez para a edição de 2019 da Art Basel Miami Beach, onde foi originalmente vendida por algo entre US$ 120 mil e US$ 150 mil. Obras de arte conceituais são essencialmente ideias. O que o artista normalmente vende é um certificado de autenticidade e uma lista de instruções para os proprietários sobre como manter ou recriar suas compras. Cattelan fez três edições de “Comedian”. Assim que seu pagamento for compensado com a casa de leilões, Sun provavelmente herdará a lista surpreendentemente detalhada de 14 páginas de instruções com diagramas que Cattelan forneceu a outros colecionadores da banana, incluindo o Museu Solomon R. Guggenheim, que recebeu uma versão de um doador anônimo alguns anos atrás. As instruções incluem diagramas e uma explicação de como a banana deve ser instalada e exibida, incluindo permissão para substituir a banana quando ela apodrecer. Lena Stringari, a conservadora-chefe do Guggenheim na época, disse que as instruções são fáceis de seguir: elas sugerem trocar a banana a cada sete a 10 dias e fixá-la a cerca de 5 pés e 9 polegadas acima do solo. Um novo rolo de fita adesiva prateada está incluído. O que Cattelan ganha com essa venda? Nada! A não ser muita atenção. Cattelan já recebeu uma taxa, não revelada, quando vendeu a banana originalmente (a obra é o nº 2 das três edições criadas pelo artista). O comprador então consignou a banana para o leilão da Sotheby's. Embora os artistas recebam uma porcentagem das revendas em países como Reino Unido, França e Itália, esse não é o caso nos Estados Unidos. Nos últimos anos, os artistas recorreram a ferramentas de blockchain, como NFTs, para manter royalties de revenda em seus contratos. Casas de leilão como a Sotheby's honraram esses contratos, mesmo quando o mercado NFT as abandonou. Mas obras de arte — sejam elas tradicionais ou não convencionais, como “Comedian” — não têm disposições que exijam que uma parte do pagamento seja redirecionada ao artista. “Casas de leilão e colecionadores colhem os benefícios, enquanto o criador, que faz o próprio objeto que impulsiona o mercado, é deixado de fora”, disse Cattelan em uma entrevista antes da venda. “NFTs oferecem royalties a cada revenda. Não parece estranho que o mercado de arte tradicional não tenha adotado um sistema semelhante?” Por que alguém pagaria US$ 6,2 milhões por uma banana? Obra 'Comedian', de Maurizio Castellan, em exposição na Sotheby's, em Nova York TIMOTHY A. CLARY / AFP De acordo com Sun, “Esta não é apenas uma obra de arte; representa um fenômeno cultural que une os mundos da arte, dos memes e da comunidade de criptomoedas. Acredito que esta peça vá inspirar mais pensamento e discussão no futuro e se tornará parte da história.” De forma mais geral, participar do mercado de arte dá aos ultrarricos influência cultural, autorrealização e um senso de comunidade. Construir uma coleção muitas vezes torna-se o primeiro passo para ingressar nos conselhos de museus e grupos influentes sem fins lucrativos, onde os ricos podem estabelecer seus legados e construir relações com outros empresários. Nos últimos anos, os novos ricos do mundo das criptomoedas e outras indústrias também compraram obras de arte para promover a si mesmos e seus negócios. Mesmo os que não conseguem garantir o lance vencedor muitas vezes estão dispostos a revelar suas identidades para fins publicitários. Quanto custa uma banana nos EUA? Numa barraca de frutas no Upper West Side, em Manhattan, custa US$ 0,25. Os preços eram um pouco mais altos na barraca perto da Sotheby's, no Upper East Side, onde a casa de leilões comprou sua banana. O vendedor que trabalhava lá na quarta-feira à noite, um imigrante de Bangladesh, disse que uma banana custava US$ 0,35. Ele não sabia que a apenas alguns metros de distância, sua banana se tornaria uma obra de arte avaliada em US$ 6,2 milhões. Ele não respondeu se aumentaria seus preços. Quem é Justin Sun? Justin Sun, de 34 anos, fundou a tron, uma criptomoeda. Ano passado, ele foi denunciado pela Comissão de Valores Mobiliários dos EUA pela venda não registrada de títulos de ativos criptográficos, bem como práticas que criaram a falsa aparência de forte interesse dos investidores por suas moedas digitais. A comissão também acusou oito celebridades, incluindo a atriz Lindsay Lohan, de promover ilegalmente as criptomoedas de Sun. Ele contestou as acusações, argumentando em um processo judicial que a comissão aplicou mal a lei e não tem jurisdição. Nascido na China, Sun também tem cidadania granadina e foi por um tempo embaixador de Granada na Organização Mundial do Comércio. Ele ainda usa o honorífico "sua excelência" no site da tron. Em entrevistas, disse que ficou fascinado pelo negócio de criptomoedas depois de estudar na Universidade da Pensilvânia. Atualmente, ele trabalha com o consultor de arte Sydney Xiong, que o ajudou a comprar a pintura de Picasso, por US$ 20 milhões, num leilão da Christie’s em 2021 e a escultura de Giacometti, por US$ 78,4 milhões, naquele mesmo ano, na Sotheby’s. Além disso, o consultor e o empreendedor trabalharam juntos na APENFT, uma fundação que fornece dinheiro a artistas que trabalham para preencher a lacuna entre os mundos da arte tradicional e digital. Chega de brincadeira. Quem acredita que uma banana é arte de verdade? Os artistas têm expandido os limites do que se define como arte há séculos. Um exemplo notório — e que sem dúvida inspirou Cattelan a conceber sua banana irreverente — vem do artista francês Marcel Duchamp. Em 1917, Duchamp virou um mictório de lado e escreveu o nome fictício R. Mutt na porcelana, como uma assinatura de artista. Ele declarou que o mictório havia sido transformado em uma escultura chamada "Fonte", para o horror do mundo da arte tradicional daquela geração. O artista também transformou produtos comerciais como ancinhos, bancos, pás e cabides em "ready-mades" que foram aceitos como obras de arte simplesmente porque ele disse que eram. Com sua banana, Cattelan estava provocando perguntas semelhantes sobre o papel da opinião pública e das instituições de elite na definição do que é e do que não é arte. Mas ele também estava chamando a atenção para o apetite do mercado de arte por qualquer coisa — até mesmo uma fruta comum — que possa ser comercializada e rotulada como uma obra de arte válida.

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