'Newstalgia': Geração Z reinterpreta o passado para seguir em frente
Novas versões de antigos sucessos na música, moda e lifestyle viralizam nas redes sociais Na canção “O tempo não para”, lançada em 1988, Cazuza escreveu “eu vejo um museu de grandes novidades”. Mal sabia ele que, em 2024, essa frase seria tão atual. Prova disso é a “newstalgia”. Alvo de diversas abordagens pelos pesquisadores de tendências on e off-line, o movimento ganha cada vez mais destaque, da moda à música, passando pelo décor. A publicitária Mari Galindo, dona da agência Nice House, onde trabalha diretamente com criadores de conteúdo para o TikTok, é uma estudiosa do assunto. “A Geração Z carrega em si um sentimento apocalíptico. Nasceu e cresceu num contexto de crise permanente, sendo muito impactada pela questão climática e por uma certa desesperança”, analisa. “Por esses motivos, costuma olhar para o passado como um lugar em que as coisas deram certo.” Ela cita alguns exemplos como evidências. “Mais de 70% das listas do Spotify são recheadas de música dos anos 1960 e 1970. Há também um boom de filtros analógicos, reverenciando a estética retrô, nas redes. O mais interessante disso tudo é o passado ser acessado por meio do digital, que tem a função de sintetizá-lo e relançá-lo. Assim surgiu o MTG (forma abreviada de montagem), que pinça músicas da MPB, em geral, grandes sucessos nos anos 1990 e 2000, e as mistura com batida de funk. De tanto viralizar, acabaram virando um gênero musical”, observa. Criadora de conteúdo e compositora, a goiana Nina Baiocchi, de 25 anos, identifica-se com a estética vintage. No seu perfil do Instagram, onde tem dois milhões de seguidores, publica vídeos com elementos de outros tempos. “Sou apaixonada por cenários das décadas 1950 e 1960. Acho que, atualmente, tudo está muito igual, minimalista. Os ambientes antigos nos levam para um lugar quentinho”, explica. “Trazer a nostalgia para esse mundo em que tudo parece frio, seja na estética ou nos temas abordados, dá uma sensação de conforto e acolhimento. Estamos vivendo essa volta.” Ela também procura dar visibilidade a mulheres de outras gerações, que merecem “o protagonismo”. “Faço vídeos com a minha avó e mostro o contraste geracional.” Quem também bebe dessa fonte é a estudante de Moda carioca Maria Annuza, de 22 anos. “Sou viciada nas décadas de 1920 e 1930. É melhor olhar para o passado do que para o futuro, que pode ser desastroso. A sensação que tenho é de que ninguém vai conseguir reformar o mundo, que o capitalismo está evoluindo mais e mais e que, devido à tecnologia, é impossível descansar”, reflete. O escritor André Carvalhal acha positivo o resgate do passado, mas faz ressalvas. “É sintoma de um mundo em que não há a produção de nada novo. Dos anos 2000 para cá, há um mix de um monte de coisa. Funciona como reflexo do nosso tempo: a gente não olha para as nossas necessidades do presente nem para as do futuro, e o que devemos fazer para nos prepararmos para ele”, avalia. Mari Galindo atribui à incerteza dos próximos anos a epidemia de ansiedade. “A Geração Z vai disputar mercado com a inteligência artificial. E isso causa surtos de angústia. É raro ver um jovem almejar passar dez anos na mesma empresa. Mas qual empresa deseja manter um funcionário por uma década?” Melhor mesmo se inspirar no passado.
Novas versões de antigos sucessos na música, moda e lifestyle viralizam nas redes sociais Na canção “O tempo não para”, lançada em 1988, Cazuza escreveu “eu vejo um museu de grandes novidades”. Mal sabia ele que, em 2024, essa frase seria tão atual. Prova disso é a “newstalgia”. Alvo de diversas abordagens pelos pesquisadores de tendências on e off-line, o movimento ganha cada vez mais destaque, da moda à música, passando pelo décor. A publicitária Mari Galindo, dona da agência Nice House, onde trabalha diretamente com criadores de conteúdo para o TikTok, é uma estudiosa do assunto. “A Geração Z carrega em si um sentimento apocalíptico. Nasceu e cresceu num contexto de crise permanente, sendo muito impactada pela questão climática e por uma certa desesperança”, analisa. “Por esses motivos, costuma olhar para o passado como um lugar em que as coisas deram certo.” Ela cita alguns exemplos como evidências. “Mais de 70% das listas do Spotify são recheadas de música dos anos 1960 e 1970. Há também um boom de filtros analógicos, reverenciando a estética retrô, nas redes. O mais interessante disso tudo é o passado ser acessado por meio do digital, que tem a função de sintetizá-lo e relançá-lo. Assim surgiu o MTG (forma abreviada de montagem), que pinça músicas da MPB, em geral, grandes sucessos nos anos 1990 e 2000, e as mistura com batida de funk. De tanto viralizar, acabaram virando um gênero musical”, observa. Criadora de conteúdo e compositora, a goiana Nina Baiocchi, de 25 anos, identifica-se com a estética vintage. No seu perfil do Instagram, onde tem dois milhões de seguidores, publica vídeos com elementos de outros tempos. “Sou apaixonada por cenários das décadas 1950 e 1960. Acho que, atualmente, tudo está muito igual, minimalista. Os ambientes antigos nos levam para um lugar quentinho”, explica. “Trazer a nostalgia para esse mundo em que tudo parece frio, seja na estética ou nos temas abordados, dá uma sensação de conforto e acolhimento. Estamos vivendo essa volta.” Ela também procura dar visibilidade a mulheres de outras gerações, que merecem “o protagonismo”. “Faço vídeos com a minha avó e mostro o contraste geracional.” Quem também bebe dessa fonte é a estudante de Moda carioca Maria Annuza, de 22 anos. “Sou viciada nas décadas de 1920 e 1930. É melhor olhar para o passado do que para o futuro, que pode ser desastroso. A sensação que tenho é de que ninguém vai conseguir reformar o mundo, que o capitalismo está evoluindo mais e mais e que, devido à tecnologia, é impossível descansar”, reflete. O escritor André Carvalhal acha positivo o resgate do passado, mas faz ressalvas. “É sintoma de um mundo em que não há a produção de nada novo. Dos anos 2000 para cá, há um mix de um monte de coisa. Funciona como reflexo do nosso tempo: a gente não olha para as nossas necessidades do presente nem para as do futuro, e o que devemos fazer para nos prepararmos para ele”, avalia. Mari Galindo atribui à incerteza dos próximos anos a epidemia de ansiedade. “A Geração Z vai disputar mercado com a inteligência artificial. E isso causa surtos de angústia. É raro ver um jovem almejar passar dez anos na mesma empresa. Mas qual empresa deseja manter um funcionário por uma década?” Melhor mesmo se inspirar no passado.
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