Nada de corte de gastos até agora: analistas explicam por que incerteza fiscal eleva dólar e prejudica a Bolsa

Com três semanas de discussões sem conclusão no governo, cresce o ceticismo dos investidores sobre a capacidade de a equipe econômica conseguir do presidente Lula corte substancial de gastos O dólar comercial encerrou ontem em alta pelo quarto dia útil consecutivo. A moeda, que chegou a superar os R$ 5,81 pela manhã, fechou com valorização de 0,56%, aos R$ 5,769. E não se trata apenas da valorização da moeda americana no mundo por causa da vitória de Donald Trump na eleição presidencial dos EUA. Com a alta na cotação comercial, o dólar turismo acompanhou e chegou a superar os R$ 6,10. No Rio, a Travelex Confidence vendia a moeda em espécie a R$ 6,10 e no cartão pré-pago a R$ 6,20. O real se desvaloriza, assim como ações na Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, por causa da frustração de investidores à espera do prometido corte de gastos públicos. Pacote fiscal: Lula vai incluir Ministério da Defesa em discussão sobre corte de gastos Décimo terceiro salário: calculadora do GLOBO mostra quanto trabalhador ainda tem a receber no fim do ano Ontem, após dias de queda na contramão do mundo, o principal índice da B3, o Ibovespa, encerrou praticamente estável, com 0,03% de alta, aos 127.873 pontos. As Bolsas americanas, enquanto isso, batem recordes históricos e reduzem a atratividade da brasileira. Em discussão no governo há três semanas, até agora nada foi divulgado do pacote. A incerteza sobre a política fiscal prejudica ativos brasileiros porque os investidores veem mais risco na economia do país, explicam analistas. Emídio de Souza: Deputado próximo a Lula critica PT por assinar manifesto contra corte de gastos Inicialmente prometida para os dias seguintes ao segundo turno das eleições municipais, em 29 de outubro, a suposta proposta de cortes estruturais no Orçamento ainda é desconhecida e continua sendo debatida em reuniões no governo. Ceticismo cresce no mercado O mercado já mostra ceticismo sobre o plano de redução de despesas públicas. As incertezas de gestores e analistas vão desde a natureza das medidas — se serão estruturais ou apenas reduções de caráter mais gerencial — até se os cortes realmente serão executados como prometido. — Vemos uma resistência muito grande do presidente em voltar atrás em gastos sociais, como os do salário mínimo — observa Carlos Kawall, sócio-fundador da Oriz Partners e ex-secretário do Tesouro Nacional. O economista Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro Ana Paula Paiva/Valor O surgimento de um “cenário virtuoso” após a esperada apresentação do pacote de medidas de cortes tem “probabilidade desprezível”, avalia o ex-diretor do Banco Central Carlos Viana. Ele considera possível um “pacote um pouco mais robusto”, que o mercado aceite por algum tempo, mas a tendência seria novas questões fiscais se apresentarem com o tempo. “A tensão ao longo do tempo vai ser crescente”, disse Viana, que é chefe de pesquisa da Kapitalo, em evento do UBS nesta segunda-feira em São Paulo. Initial plugin text A Verde Asset Management, comandada pelo celebrado Luis Stuhlberger, avaliou, em uma carta enviada aos cotistas de seu principal fundo multimercado, que o governo “tem sistematicamente prometido mais do que é capaz de entregar” em relação a reformas fiscais. Para os gestores do fundo Verde, os sinais de pressão na inflação devem levar o Banco Central a acelerar o aumento da taxa de juros no Brasil, aumentando as dificuldades para as ações na Bolsa. O Verde informou que possui posição líquida neutra na Bolsa brasileira. A Verde administra atualmente cerca de R$ 19 bilhões. 'Estancar ou desacelerar' Com o pacote de medidas de corte de gastos, o governo pode “estancar ou desacelerar” a crise de confiança, mas resolver o problema exigiria “um movimento fiscal que parece muito claro que não está disposto a fazer”, afirma Pedro Jobim, economista-chefe e sócio da Legacy Capital, também durante evento do UBS. Initial plugin text O mercado elevou a precificação da taxa básica de juros, a Selic, para 14% no final do atual ciclo de aperto monetário, em meados de 2025. Os contratos de juros futuros subiram cerca de 50 pontos nos últimos 30 dias, com os riscos fiscais domésticos combinados à volatilidade externa diante das eleições americanas. Helena Veronese, economista-chefe da B.Side Investimentos, ressalta que a pressão dos fatores domésticos sobre o dólar foi maior pela ausência de influência de fora. O mercado de títulos do Tesouro americano não operou ontem devido ao feriado do Dia dos Veteranos nos EUA. Para Helena, um anúncio de revisão que supere os R$ 40 bilhões pode começar a reduzir a pressão na moeda. Mas a divisa segue refletindo o atraso, que aumenta a desconfiança dos investidores: — Há a questão do timing, e quanto mais o mercado espera, mais fica receoso. Gustavo Okuyama, gestor de renda fixa da Porto Asset, avalia que o feriado nos EUA ajudou a valorização do dólar em todo o mundo por causa da menor liquidez. Juros pressionados A falta de apresentação de medidas concret

Nov 12, 2024 - 01:01
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Nada de corte de gastos até agora: analistas explicam por que incerteza fiscal eleva dólar e prejudica a Bolsa

Com três semanas de discussões sem conclusão no governo, cresce o ceticismo dos investidores sobre a capacidade de a equipe econômica conseguir do presidente Lula corte substancial de gastos O dólar comercial encerrou ontem em alta pelo quarto dia útil consecutivo. A moeda, que chegou a superar os R$ 5,81 pela manhã, fechou com valorização de 0,56%, aos R$ 5,769. E não se trata apenas da valorização da moeda americana no mundo por causa da vitória de Donald Trump na eleição presidencial dos EUA. Com a alta na cotação comercial, o dólar turismo acompanhou e chegou a superar os R$ 6,10. No Rio, a Travelex Confidence vendia a moeda em espécie a R$ 6,10 e no cartão pré-pago a R$ 6,20. O real se desvaloriza, assim como ações na Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, por causa da frustração de investidores à espera do prometido corte de gastos públicos. Pacote fiscal: Lula vai incluir Ministério da Defesa em discussão sobre corte de gastos Décimo terceiro salário: calculadora do GLOBO mostra quanto trabalhador ainda tem a receber no fim do ano Ontem, após dias de queda na contramão do mundo, o principal índice da B3, o Ibovespa, encerrou praticamente estável, com 0,03% de alta, aos 127.873 pontos. As Bolsas americanas, enquanto isso, batem recordes históricos e reduzem a atratividade da brasileira. Em discussão no governo há três semanas, até agora nada foi divulgado do pacote. A incerteza sobre a política fiscal prejudica ativos brasileiros porque os investidores veem mais risco na economia do país, explicam analistas. Emídio de Souza: Deputado próximo a Lula critica PT por assinar manifesto contra corte de gastos Inicialmente prometida para os dias seguintes ao segundo turno das eleições municipais, em 29 de outubro, a suposta proposta de cortes estruturais no Orçamento ainda é desconhecida e continua sendo debatida em reuniões no governo. Ceticismo cresce no mercado O mercado já mostra ceticismo sobre o plano de redução de despesas públicas. As incertezas de gestores e analistas vão desde a natureza das medidas — se serão estruturais ou apenas reduções de caráter mais gerencial — até se os cortes realmente serão executados como prometido. — Vemos uma resistência muito grande do presidente em voltar atrás em gastos sociais, como os do salário mínimo — observa Carlos Kawall, sócio-fundador da Oriz Partners e ex-secretário do Tesouro Nacional. O economista Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro Ana Paula Paiva/Valor O surgimento de um “cenário virtuoso” após a esperada apresentação do pacote de medidas de cortes tem “probabilidade desprezível”, avalia o ex-diretor do Banco Central Carlos Viana. Ele considera possível um “pacote um pouco mais robusto”, que o mercado aceite por algum tempo, mas a tendência seria novas questões fiscais se apresentarem com o tempo. “A tensão ao longo do tempo vai ser crescente”, disse Viana, que é chefe de pesquisa da Kapitalo, em evento do UBS nesta segunda-feira em São Paulo. Initial plugin text A Verde Asset Management, comandada pelo celebrado Luis Stuhlberger, avaliou, em uma carta enviada aos cotistas de seu principal fundo multimercado, que o governo “tem sistematicamente prometido mais do que é capaz de entregar” em relação a reformas fiscais. Para os gestores do fundo Verde, os sinais de pressão na inflação devem levar o Banco Central a acelerar o aumento da taxa de juros no Brasil, aumentando as dificuldades para as ações na Bolsa. O Verde informou que possui posição líquida neutra na Bolsa brasileira. A Verde administra atualmente cerca de R$ 19 bilhões. 'Estancar ou desacelerar' Com o pacote de medidas de corte de gastos, o governo pode “estancar ou desacelerar” a crise de confiança, mas resolver o problema exigiria “um movimento fiscal que parece muito claro que não está disposto a fazer”, afirma Pedro Jobim, economista-chefe e sócio da Legacy Capital, também durante evento do UBS. Initial plugin text O mercado elevou a precificação da taxa básica de juros, a Selic, para 14% no final do atual ciclo de aperto monetário, em meados de 2025. Os contratos de juros futuros subiram cerca de 50 pontos nos últimos 30 dias, com os riscos fiscais domésticos combinados à volatilidade externa diante das eleições americanas. Helena Veronese, economista-chefe da B.Side Investimentos, ressalta que a pressão dos fatores domésticos sobre o dólar foi maior pela ausência de influência de fora. O mercado de títulos do Tesouro americano não operou ontem devido ao feriado do Dia dos Veteranos nos EUA. Para Helena, um anúncio de revisão que supere os R$ 40 bilhões pode começar a reduzir a pressão na moeda. Mas a divisa segue refletindo o atraso, que aumenta a desconfiança dos investidores: — Há a questão do timing, e quanto mais o mercado espera, mais fica receoso. Gustavo Okuyama, gestor de renda fixa da Porto Asset, avalia que o feriado nos EUA ajudou a valorização do dólar em todo o mundo por causa da menor liquidez. Juros pressionados A falta de apresentação de medidas concretas para frear a subida dos gastos públicos também se refletiu na curva de juros futuros. Ontem, os contratos para janeiro de 2026, 2027 e 2028 eram negociados acima dos 13%, o que indica receio com a atual trajetória da política fiscal. Os investidores começaram a apostar, também na curva, que o Banco Central possa subir a taxa básica Selic em 0,75 ponto percentual em dezembro, alcançando 12% ainda em 2024. Já para 2025, o mercado vê a Selic alcançando 14% no segundo semestre. Na B3, segundo Lucas Serra, analista da Toro Investimentos, o volume negociado ficou menor que o habitual, por conta do feriado nos EUA: — Hoje não houve nenhum driver (impulso) específico — afirmou, pontuando que o mercado atua em compasso de espera pelo anúncio do pacote de revisão de gastos. As maiores quedas foram dos papéis ligados à siderurgia. A frustração com o pacote de estímulos anunciado pela China na semana passada fez o preço da tonelada do minério de ferro recuar 1,7% em Cingapura. A CSN recuou 3,91% a R$ 11,29, enquanto a Usiminas cedeu 2,56%, aos 6,09. Já a Vale teve queda de 3,27%, aos R$ 58,65. A empresa amarga R$ 22 bilhões de perdas em valor de mercado desde a última quinta-feira. Ontem, a mineradora ainda sofreu um corte de recomendação para compra dos recibos de ações (ADRs) em Nova York pelo banco suíço UBS, além da redução do preço-alvo de US$ 14 para US$ 11,50. *Estagiária, sob a supervisão de Danielle Nogueira Com informações da Bloomberg News

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