COP29 começa hoje no Azerbaijão com desafios que podem impactar sucesso da COP30 no Brasil, no ano que vem

Eleição de Donald Trump nos EUA também levanta preocupações sobre acordos pendentes A 29ª conferência do clima da ONU (COP29) começa nesta segunda-feira em Baku, no Azerbaijão, com uma enorme lista de tarefas a cumprir num momento de turbulência diplomática. Sediado em uma região afetada por duas guerras, e logo após os EUA elegerem um presidente hostil à pauta climática, o evento também sofre um esvaziamento de autoridades por conta do encontro do G20, que acontece na semana que vem no Rio. COP29: Calor extremo, fenômenos meteorológicos incontroláveis ​​e poluição representam ameaça crescente à saúde 'Consequências letais': 2024 deve ser o primeiro ano com aquecimento de +1,5ºC, diz observatório europeu Esse cenário desfavorável preocupa o Brasil, porque o sucesso da COP30, marcada para 2025, em Belém, depende de que o encontro em Baku entregue uma série de decisões. O maior problema, que se agrava a cada ano, é a demora de governos em apresentarem metas ambiciosas de corte de emissões de gases de efeito estufa. As promessas de cada país nesse tópico, os documentos conhecidos como contribuições nacionalmente determinadas (NDCs), permitem à ONU calcular o tamanho do atraso nas medidas para impedir o planeta de aquecer mais de 1,5°C, o limite primário estabelecido pelo Acordo de Paris para o clima. O planeta já esquentou mais de 1,1°C acima do normal. O Relatório sobre Lacuna de Emissões, produzido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), indica que as NDCs atuais põem o planeta rumo a um aquecimento de 2,8°C neste século, cenário perigoso e até mesmo acima do limite secundário de Paris, de 2°C. Medidas: Governo anuncia ampliação de meta corte de CO2 sem publicar documento oficial A lacuna em questão é a que existe entre as atuais emissões globais de 56,7 bilhões de toneladas de CO² por ano e os 24,7 bilhões a que precisam chegar até 2035. Muitos países não estão na rota de cumprir suas NDCs. E, mesmo que estivessem, o corte seria de apenas 5,6 bilhões nessa cifra. Esse número é a ponta “otimista” da previsão, considerando que sejam cumpridas condições exigidas por alguns países para fazer seus cortes de emissão (em outras palavras, financiamento). Levadas em conta só as promessas incondicionais, o cenário é ainda pior. Finanças na mesa A outra lacuna crucial na negociação é a demora dos países ricos em criar um fluxo de recursos para ajudar os pobres a se adaptarem a um clima mais hostil e usarem mais energia limpa. Além das NDCs, outra sigla no dia a dia dos diplomatas é NCQD: a Nova Meta Quantificada Coletiva em Financiamento Climático, que precisa ser definida este ano. O Acordo de Paris indicava que os recursos para a transição energética do mundo em desenvolvimento deveriam atingir os US$ 100 bilhões anuais (R$ 573 bilhões), número que estudos questionam que tenha sido atingido. COP29 no Azerbaijão: Oposição denuncia perseguição política, inclusive contra ambientalistas Cumprida ou não, a promessa ainda está longe de cobrir necessidades globais, e novas propostas falam em alocar até US$ 1 trilhão anual (R$ 5,73 trilhões) para esse fim. Antes de cada país rico colocar suas cartas na mesa, poucos se arriscam a prever o número a que chegarão. — Não ter uma decisão NCQD boa agora põe o regime inteiro em situação de estresse e o Acordo de Paris na UTI. Se a COP29 não entregar isso, restaria só um ano para juntar as peças e chegar a Belém com alguma coisa sólida — diz Natalie Unterstell, presidente do centro de estudo climático Instituto Talanoa. O Brasil, anfitrião da COP30, anunciou na semana passada uma redução anual de 30% no desmatamento, sua principal fonte de emissão. O número é um cartão de visita importante para buscar legitimidade moral do país como líder nas negociações até lá, sobretudo na ausência de chefes de Estado e governo em negociações. Sem Lula, que cancelou viagens internacionais após uma queda doméstica, a delegação brasileira na COP29 terá como líder o vice-presidente Geraldo Alckmin. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, deve equilibrar a agenda do Azerbaijão com eventos do G20 no Brasil. Os EUA, maiores emissores do planeta entre países ricos, são representados por seu enviado especial para o clima, John Podesta, e ministros. Após Donald Trump ter sido eleito, porém, o governo Joe Biden desembarca em Baku como “pato manco”, sem legitimidade para promessas no horizonte. Trump, que já tirou os EUA do Acordo de Paris em seu primeiro mandato, promete fazê-lo de novo, depois de Biden tê-lo retomado. Não se sabe ainda em que termos isso será feito. Analistas avaliam que Trump pode, sim, sabotar a negociação de financiamento climático, mas talvez não comprometa totalmente o corte de CO² nos EUA. A NDC do país está ancorada no Ato de Redução da Inflação, pacote de medidas que inclui volumosos recursos para estados e empresas reduzirem gases-estufa. De todo modo, autoridades brasileiras ainda têm cautela em falar dos EUA. — Nós temos uma relação muito boa com t

Nov 11, 2024 - 05:07
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COP29 começa hoje no Azerbaijão com desafios que podem impactar sucesso da COP30 no Brasil, no ano que vem

Eleição de Donald Trump nos EUA também levanta preocupações sobre acordos pendentes A 29ª conferência do clima da ONU (COP29) começa nesta segunda-feira em Baku, no Azerbaijão, com uma enorme lista de tarefas a cumprir num momento de turbulência diplomática. Sediado em uma região afetada por duas guerras, e logo após os EUA elegerem um presidente hostil à pauta climática, o evento também sofre um esvaziamento de autoridades por conta do encontro do G20, que acontece na semana que vem no Rio. COP29: Calor extremo, fenômenos meteorológicos incontroláveis ​​e poluição representam ameaça crescente à saúde 'Consequências letais': 2024 deve ser o primeiro ano com aquecimento de +1,5ºC, diz observatório europeu Esse cenário desfavorável preocupa o Brasil, porque o sucesso da COP30, marcada para 2025, em Belém, depende de que o encontro em Baku entregue uma série de decisões. O maior problema, que se agrava a cada ano, é a demora de governos em apresentarem metas ambiciosas de corte de emissões de gases de efeito estufa. As promessas de cada país nesse tópico, os documentos conhecidos como contribuições nacionalmente determinadas (NDCs), permitem à ONU calcular o tamanho do atraso nas medidas para impedir o planeta de aquecer mais de 1,5°C, o limite primário estabelecido pelo Acordo de Paris para o clima. O planeta já esquentou mais de 1,1°C acima do normal. O Relatório sobre Lacuna de Emissões, produzido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), indica que as NDCs atuais põem o planeta rumo a um aquecimento de 2,8°C neste século, cenário perigoso e até mesmo acima do limite secundário de Paris, de 2°C. Medidas: Governo anuncia ampliação de meta corte de CO2 sem publicar documento oficial A lacuna em questão é a que existe entre as atuais emissões globais de 56,7 bilhões de toneladas de CO² por ano e os 24,7 bilhões a que precisam chegar até 2035. Muitos países não estão na rota de cumprir suas NDCs. E, mesmo que estivessem, o corte seria de apenas 5,6 bilhões nessa cifra. Esse número é a ponta “otimista” da previsão, considerando que sejam cumpridas condições exigidas por alguns países para fazer seus cortes de emissão (em outras palavras, financiamento). Levadas em conta só as promessas incondicionais, o cenário é ainda pior. Finanças na mesa A outra lacuna crucial na negociação é a demora dos países ricos em criar um fluxo de recursos para ajudar os pobres a se adaptarem a um clima mais hostil e usarem mais energia limpa. Além das NDCs, outra sigla no dia a dia dos diplomatas é NCQD: a Nova Meta Quantificada Coletiva em Financiamento Climático, que precisa ser definida este ano. O Acordo de Paris indicava que os recursos para a transição energética do mundo em desenvolvimento deveriam atingir os US$ 100 bilhões anuais (R$ 573 bilhões), número que estudos questionam que tenha sido atingido. COP29 no Azerbaijão: Oposição denuncia perseguição política, inclusive contra ambientalistas Cumprida ou não, a promessa ainda está longe de cobrir necessidades globais, e novas propostas falam em alocar até US$ 1 trilhão anual (R$ 5,73 trilhões) para esse fim. Antes de cada país rico colocar suas cartas na mesa, poucos se arriscam a prever o número a que chegarão. — Não ter uma decisão NCQD boa agora põe o regime inteiro em situação de estresse e o Acordo de Paris na UTI. Se a COP29 não entregar isso, restaria só um ano para juntar as peças e chegar a Belém com alguma coisa sólida — diz Natalie Unterstell, presidente do centro de estudo climático Instituto Talanoa. O Brasil, anfitrião da COP30, anunciou na semana passada uma redução anual de 30% no desmatamento, sua principal fonte de emissão. O número é um cartão de visita importante para buscar legitimidade moral do país como líder nas negociações até lá, sobretudo na ausência de chefes de Estado e governo em negociações. Sem Lula, que cancelou viagens internacionais após uma queda doméstica, a delegação brasileira na COP29 terá como líder o vice-presidente Geraldo Alckmin. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, deve equilibrar a agenda do Azerbaijão com eventos do G20 no Brasil. Os EUA, maiores emissores do planeta entre países ricos, são representados por seu enviado especial para o clima, John Podesta, e ministros. Após Donald Trump ter sido eleito, porém, o governo Joe Biden desembarca em Baku como “pato manco”, sem legitimidade para promessas no horizonte. Trump, que já tirou os EUA do Acordo de Paris em seu primeiro mandato, promete fazê-lo de novo, depois de Biden tê-lo retomado. Não se sabe ainda em que termos isso será feito. Analistas avaliam que Trump pode, sim, sabotar a negociação de financiamento climático, mas talvez não comprometa totalmente o corte de CO² nos EUA. A NDC do país está ancorada no Ato de Redução da Inflação, pacote de medidas que inclui volumosos recursos para estados e empresas reduzirem gases-estufa. De todo modo, autoridades brasileiras ainda têm cautela em falar dos EUA. — Nós temos uma relação muito boa com todos os países, porque sabem que o Brasil está liderando pelo exemplo — disse em entrevista coletiva na semana passada a secretária nacional de Clima, Ana Toni. — O Brasil consegue falar tanto com os países que têm mais dificuldade com essa pauta de mudança do clima, quanto com os países que querem avançar muito mais rápido. Discursos à parte, ambientalistas criticaram o anúncio apressado que o país fez de sua nova NDC na última sexta-feira, que amplia as promessas de corte do brasil em até 29% para 2035. Os números estão “desalinhados com a contribuição justa do Brasil”, afirmou o Observatório do Clima, maior coalizão de ONGs ambientais do país. Ativismo vigiado Protestos de ONGs, que contribuem para uma dinâmica mais proativa nas COPs, devem ocorrer de forma limitada em Baku, dentro da “zona azul” em que participantes têm livre circulação. Num país autocrático, após episódios recentes de censura e prisão de manifestantes, ativistas ambientais têm certo receio de promover aglomerações. Grupos brasileiros independentes ainda não sabem onde vão realizar um evento que pretende reunir 150 representantes da sociedade civil em Baku. O secretário-geral do Observatório do Clima, Márcio Astrini, mostra pouco otimismo com a COP29, lembrando que o Azerbaijão é contra uma menção direta ao problema dos combustíveis fósseis, grandes vilões do aquecimento global, no texto final da COP29. — Esta é uma COP de muito risco, porque o ambiente de negociação é ruim — diz. — O sucesso depende muito daquilo que vai acontecer com o financiamento, que é uma discussão que já se arrasta há bastante tempo e num clima de desconfiança entre os países.

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