Sem cometerem erros graves, Walz e Vance miram em indecisos no debate de vices à Casa Branca
Companheiros de chapa de Kamala Harris e Donald Trump foram cordiais e travaram discussão nem sempre emocionante, mas marcada por discussão civilizada sobre temas importantes para o país, artigo raro na cena política contemporânea O governador de Minnesota, Tim Walz, e o senador por Ohio J.D. Vance, respectivamente candidatos a vice-presidente nas chapas democrata e republicana, tinham uma missão principal no único debate que devem ter até as eleições do dia 5 de novembro: não cometer erros tão escandalosos que comprometessem a vice-presidente Kamala Harris e o ex-presidente Donald Trump, empatados em todas as pesquisas para decidir quem comandará a Casa Branca a partir de janeiro. Terminaram a noite de terça-feira incólumes. Se Vance foi claramente mais confortável em expressar seus argumentos na televisão, Walz, bem mais nervoso, conseguiu até dar alguns poucos mas bons golpes contra os republicanos, como ao citar a idade avançada de Trump ao responder sobre se concordaria com um ataque preventivo de Israel ao Irã para evitar que o país conseguisse produzir armas nucleares. Os dois candidatos evitaram um sim ou não claro sobre a questão. Walz criticou Trump por retirar Washington do acordo nucelar com o Irã e Vance culpou Biden, e Kamala, pelo avanço militar de Teerã ilustrado no mesmo dia pelos 180 mísseis lançados contra Israel. Uma das estratégias centrais de Vance durante toda a noite foi a de apresentar Kamala como parte central do atual governo, e, portanto, distante do desejo de mudança expressado pelos eleitores nas pesquisas, de olho nos indecisos. Walz reagiu apresentando o legado de Trump, especialmente o econômico, como herança maldita que precisou ser fixada, e a duras penas — daí o remédio amargo resultante no aumento do custo de vida sentido pelos eleitores nos anos Biden — pelos democratas. Como a audiência do debate da rede CBS, realizado em Nova York, deve ser apenas uma fração da do duelo dos candidatos à Presidência no último 10 de setembro, na rede ABC, em que Kamala, de acordo com a quase unanimidade dos especialistas, derrotou Trump com folga, a expectativa maior era sobre qual dos dois políticos do Meio-Oeste americano se apresentaria de modo mais "presidencial". Os dois passaram no teste, com Vance um tom mais incisivo e Walz mais tímido, fiel até demais a seu papel de "homem comum", "gente como a gente", se recuperando do meio para o fim do programa. Quadro pouco conhecido do Partido Democrata, o governador chamou a atenção da campanha da vice-presidente ao empurrar os republicanos para a extrema direita ao carimbar justamente em Vance o epíteto de "esquisitão", distante do centro e da maioria dos americanos. Tarefa ajudada por declarações infelizes e preconceituosas do senador e melhor amigo de Donald Trump Jr., que, aliás, o acompanhou ao debate, sobre mulheres solteiras e seus gatos. Até da atriz Jennifer Aniston, a Rachel da série "Friends", o senador levou um puxão público de orelha. Um dos maiores problemas de Trump é justamente sua rejeição entre as eleitoras. Mentiras premeditadas Escolhido com a promessa de ser um novo Trump, Vance rapidamente se tornou o candidato a vice com maior rejeição da política americana moderna. Protagonizou um dos momentos mais indignos da corrida ao confessar que sabia ser absurda e mentirosa a teoria da conspiração repetida por ele e por Trump — inclusive no debate com Kamala — de que imigrantes não-documentados haitianos estavam capturando animais domésticos de famílias americanas em Springfield, cidade localizada no estado do senador, Ohio. A calúnia teve efeitos práticos trágicos, incluindo ameaças de bomba em escolas da cidade e de morte aos imigrantes haitianos, que, aliás vivem nos EUA legalmente. Quando o tema foi abordado pelas duas moderadoras, Walz usou tática curiosa e efetiva: não tratou da mentira do adversário diretametne, mas usou a Bíblia para fundamentar apelo para se resolver o problema com humanidade e não demonizá-lo. Lembrou que Trump vetou a dura reforma da Imigração proposta pelo governo Biden no ano passado, após a entrada recorde de pessoas não-documentadas no país, e negociada com senadores do Partido Republicano. Vance, em momento infeliz, teve seu microfone cortado ao tentar explicar, no detalhe, e fora de seu tempo, meandros da lei que permitem a interpretação de que os refugiados haitianos não são exatamente documentados. E repetiu que a entrada recorde de imigrantes gerou desemprego recorde aos americanos, aumento de criminalidade jamais visto no país e inédita crise habitacional. Mais afirmações falsas, desmentidas pelos números. Walz também mentiu muito na campanha, ao exagerar seus feitos na carreira militar e inventar que estava em Hong Kong quando da eclosão dos protestos da Praça da Paz Celestial por democracia em Pequim. Afirmou ter atravessado a fronteira para dar aulas na China continental, o que de fato fez, mas muitos meses após a repressão na Tiananmen, quando ele estava de fato nos cafundós
Companheiros de chapa de Kamala Harris e Donald Trump foram cordiais e travaram discussão nem sempre emocionante, mas marcada por discussão civilizada sobre temas importantes para o país, artigo raro na cena política contemporânea O governador de Minnesota, Tim Walz, e o senador por Ohio J.D. Vance, respectivamente candidatos a vice-presidente nas chapas democrata e republicana, tinham uma missão principal no único debate que devem ter até as eleições do dia 5 de novembro: não cometer erros tão escandalosos que comprometessem a vice-presidente Kamala Harris e o ex-presidente Donald Trump, empatados em todas as pesquisas para decidir quem comandará a Casa Branca a partir de janeiro. Terminaram a noite de terça-feira incólumes. Se Vance foi claramente mais confortável em expressar seus argumentos na televisão, Walz, bem mais nervoso, conseguiu até dar alguns poucos mas bons golpes contra os republicanos, como ao citar a idade avançada de Trump ao responder sobre se concordaria com um ataque preventivo de Israel ao Irã para evitar que o país conseguisse produzir armas nucleares. Os dois candidatos evitaram um sim ou não claro sobre a questão. Walz criticou Trump por retirar Washington do acordo nucelar com o Irã e Vance culpou Biden, e Kamala, pelo avanço militar de Teerã ilustrado no mesmo dia pelos 180 mísseis lançados contra Israel. Uma das estratégias centrais de Vance durante toda a noite foi a de apresentar Kamala como parte central do atual governo, e, portanto, distante do desejo de mudança expressado pelos eleitores nas pesquisas, de olho nos indecisos. Walz reagiu apresentando o legado de Trump, especialmente o econômico, como herança maldita que precisou ser fixada, e a duras penas — daí o remédio amargo resultante no aumento do custo de vida sentido pelos eleitores nos anos Biden — pelos democratas. Como a audiência do debate da rede CBS, realizado em Nova York, deve ser apenas uma fração da do duelo dos candidatos à Presidência no último 10 de setembro, na rede ABC, em que Kamala, de acordo com a quase unanimidade dos especialistas, derrotou Trump com folga, a expectativa maior era sobre qual dos dois políticos do Meio-Oeste americano se apresentaria de modo mais "presidencial". Os dois passaram no teste, com Vance um tom mais incisivo e Walz mais tímido, fiel até demais a seu papel de "homem comum", "gente como a gente", se recuperando do meio para o fim do programa. Quadro pouco conhecido do Partido Democrata, o governador chamou a atenção da campanha da vice-presidente ao empurrar os republicanos para a extrema direita ao carimbar justamente em Vance o epíteto de "esquisitão", distante do centro e da maioria dos americanos. Tarefa ajudada por declarações infelizes e preconceituosas do senador e melhor amigo de Donald Trump Jr., que, aliás, o acompanhou ao debate, sobre mulheres solteiras e seus gatos. Até da atriz Jennifer Aniston, a Rachel da série "Friends", o senador levou um puxão público de orelha. Um dos maiores problemas de Trump é justamente sua rejeição entre as eleitoras. Mentiras premeditadas Escolhido com a promessa de ser um novo Trump, Vance rapidamente se tornou o candidato a vice com maior rejeição da política americana moderna. Protagonizou um dos momentos mais indignos da corrida ao confessar que sabia ser absurda e mentirosa a teoria da conspiração repetida por ele e por Trump — inclusive no debate com Kamala — de que imigrantes não-documentados haitianos estavam capturando animais domésticos de famílias americanas em Springfield, cidade localizada no estado do senador, Ohio. A calúnia teve efeitos práticos trágicos, incluindo ameaças de bomba em escolas da cidade e de morte aos imigrantes haitianos, que, aliás vivem nos EUA legalmente. Quando o tema foi abordado pelas duas moderadoras, Walz usou tática curiosa e efetiva: não tratou da mentira do adversário diretametne, mas usou a Bíblia para fundamentar apelo para se resolver o problema com humanidade e não demonizá-lo. Lembrou que Trump vetou a dura reforma da Imigração proposta pelo governo Biden no ano passado, após a entrada recorde de pessoas não-documentadas no país, e negociada com senadores do Partido Republicano. Vance, em momento infeliz, teve seu microfone cortado ao tentar explicar, no detalhe, e fora de seu tempo, meandros da lei que permitem a interpretação de que os refugiados haitianos não são exatamente documentados. E repetiu que a entrada recorde de imigrantes gerou desemprego recorde aos americanos, aumento de criminalidade jamais visto no país e inédita crise habitacional. Mais afirmações falsas, desmentidas pelos números. Walz também mentiu muito na campanha, ao exagerar seus feitos na carreira militar e inventar que estava em Hong Kong quando da eclosão dos protestos da Praça da Paz Celestial por democracia em Pequim. Afirmou ter atravessado a fronteira para dar aulas na China continental, o que de fato fez, mas muitos meses após a repressão na Tiananmen, quando ele estava de fato nos cafundós da América Profunda. Teve a chance de se desculpar pela mentira no debate, mas ofereceu seu pior momento ao retrucar apenas que às vezes troca a ordem das coisas. Não convenceu. E fez os democratas sentirem falta do mais presidencial governador da Pensilvânia, Josh Shapiro, que por pouco não foi o ungido por Kamala como o vice da vice. Mentiras premeditadas têm sido uma constante na corrida à Casa Branca este ano. Na última segunda-feira, Trump mentiu sobre a reação do presidente Joe Biden ao furacão Helene. O ex-presidente alegou que o governador da Geórgia, um dos estados mais atingidos, Brian Kemp, do Partido Republicano, estava “tendo dificuldade em falar com o presidente ao telefone”. Kemp, no entanto, já havia afirmado que ele e Biden tinham conversado longamente na noite anterior e que apreciara justamente a prontidão do presidente para ajudá-lo. A Casa Branca também já havia informado àquela altura que Kamala visitaria à Geórgia na quarta-feira e que o presidente Biden iria para a Carolina do Norte, outra unidade da federação duramente afetada pelo fenômeno, no mesmo dia. Não por acaso, os dois são estados decisivos para a vitória em novembro, em que os candidatos à Casa Branca aparecem empatados na margem de erro. Perguntado no debate se concordava com a posição de Trump de que a crise do clima, uma das razões da tragédia que causou a morte de 150 cidadãos, é uma falácia, Vance saiu pela tangente e acusou o 'plano verde' de Biden de acabar com a indústria americana e beneficiar os chineses "que fabricam painéis solares", de olho no voto dos três estados decisivos e pós-industriais do Cinturão da Ferrugem, Wisconsin, Michigan e Pensilvânia. Na longa discussão sobre direitos reprodutivos, Vance buscou, de olho nas eleitoras que têm faltado ao Partido Republicano nas urnas desde a decisão da Suprema Corte de maioria conservadora que enterrou, em 2022, o direito federal ao aborto, ao se apresentar não como "pró-vida", mas "pró-família". E buscou carimbar nos adversários a pecha de "radicais pró-aborto". Walz reagiu, apresentando o caso trágico de uma mulher da Geórgia que perdeu a vida dirigindo por horas até a Carolina do Norte para encontrar o tratamento próprio de saúde, pois era proibida de interromper a gravidez em seu estado. O governador afirmou ainda que os democratas, ao contrário dos republicanos, "confiam nas mulheres e nos médicos." Walz se destaca ao defender democracia Democracia entrou na pauta no fim do debate. Vance foi confrontado sobre sua afirmação de que , ao contrário do então vice Mike Pence, hoje um pária no Partido Republicano trumpista, não teria certificado a vitória de Biden, quando o democrata derrotou Trump nas urnas em 2020. Em sua resposta, só tratou no fim do ataque ao Capitólio por hostes negacionistas incitadas pelo ex-presidente, que causaram a morte de cinco cidadãos. E ainda assim, apenas para dizer que Trump apoiara naquela noite um "ato democrático". Também afirmou que o maior risco à democracia nos EUA hoje é a censura às liberdades individuais, como opiniões nas redes sociais, que Kamala promove de "forma industrial". Walz respondeu, em um de seus melhores momentos na noite, lembrando dos policiais que foram agredidos e dos americanos que morreram no dia 6 de janeiro de 2021 para concluir que "palavras de um Presidente importam". Vance retrucou que anti-democrático é negar Trump ter saído pacificamente da Casa Branca em 2020, uma mentira. Seguidamente perguntado por Walz se reconhecia que o ex-presidente perdera a disputa no voto para Biden, Vance não respondeu. Walz argumentou então que censura é proibir livros em bibliotecas, como fizeram governos de trumpistas país afora desde 2016, e não impedir que pessoas matem outras por negarem o resultado das urnas. Encerrou, em uma troca forte, porém cordial de argumentos, afirmando que estava claro para os eleitores qual lado de fato defende a democracia — "pode-se votar em quem vai honrar a democracia ou em quem honrará o ex-presidente". A cinco semanas das eleições, esta deve ter sido a derradeira oportunidade para os americanos acompanharem um debate entre componentes das duas chapas presidenciais. Kamala já disse sim para um segundo enfrentamento com Trump, na CNN, mas o republicano declinou. Foi uma discussão nem sempre brilhante, mas marcada pela discussão civilizada sobre temas importantes para o país, artigo raro na cena política contemporânea.
Qual é a sua reação?