Projetos da sociedade civil ajudam a combater a fome e a desigualdade, temas do G20; conheça alguns deles
Ação da Cidadania já distribuiu 57 mil toneladas de alimentos; na Rocinha, Família na Mesa doa cestas básicas e produtos que busca na Ceasa O tamanho do caldeirão — que comporta 35 quilos de feijão e é usado duas vezes por dia — e a capacidade das três câmaras frigoríficas — cada uma pode acondicionar dez toneladas de alimentos — dão a dimensão da produção da cozinha solidária da Ação da Cidadania, instalada num contêiner ao lado galpão da ONG, na Gamboa, na Zona Portuária do Rio, onde acontecem os eventos paralelos do G20. Ali, são preparadas mil refeições por dia, de segunda a sexta-feira, metade para o almoço e o restante para o jantar de pessoas que não têm o que comer. Batucada boa, cerveja gelada e paquera: visitantes desfrutam das atrações do Rio e tentam a sorte de encontrar um amor no G20 Atiradores de elite, militares e cães farejadores: presença de chefes de Estado e delegações muda rotina de hotéis do Rio O combate à fome, à desigualdade e à pobreza é um dos temas da Cúpula de Líderes da conferência internacional. Assim como é o foco da Ação da Cidadania, fundada há 31 anos por Herbert de Souza, o Betinho, e de outras organizações da sociedade civil como Família na Mesa, Favela Orgânica, Quilombo Aquilah e Instituto de Medicina e Cidadania (IMC). — O meu coração fica quentinho de saber que estou alimentando tanta gente com meu trabalho — diz a cozinheira Lidiane Sena, moradora do Morro da Providência e uma das encarregadas de preparar as quentinhas da Ação da Cidadania. — A minha comunidade também recebe os kits (além da refeição, inclui talheres descartáveis, água mineral e uma fruta). Tem gente que me para e diz que a comida estava bonita e gostosa. Cozinheiros da Ação da Cidadania preparam alimentos: ONG distribui mil refeições por dia Beatriz Orle Insegurança alimentar A urgência de iniciativas para enfrentar a insegurança alimentar grave pode ser medida. Pesquisa concluída este ano pelo Instituto de Nutrição da UFRJ, em parceria com a Câmara Municipal, revela que, no Rio, 489 mil pessoas (quase 8% da população) vivem com apenas uma refeição diariamente ou passam um dia inteiro sem comer. Já dados mais recentes do IBGE, de 2022, informam que mais de um quarto da população fluminense (26,6%) tem renda familiar per capita de até US$ 6,89 (R$ 40). O estado é também o quarto mais desigual entre as 27 unidades da federação (índice Gini/2023). — O Rio é a cidade partida visível a olho nu. Apresenta níveis de desigualdade superiores aos do Brasil, um país grande, diverso e conhecido pela alta desigualdade — analisa o economista Marcelo Neri, do FGV Social. Fechamento: Atlântica será interditada em dias de reunião do G20 a pedido das forças de segurança Pratos com cruzes Neste sábado, a Ação da Cidadania e o Rio de Paz promoveram manifestação contra a fome na faixa de areia em frente ao Copacabana Palace. Foram instalados 733 pratos vazios pintados com cruzes vermelhas. Cada prato representou um milhão de pessoas que passam fome no mundo, segundo dados da ONU. O ato chamou a atenção de cariocas e turistas. — No meu trabalho, tenho contato direto com crianças que não têm o que comer — lamenta a assistente social Aline Carla Pereira, de Ituverava, no interior de São Paulo. Ato na areia: Rio de Paz e Ação da Cidadania fazem manifestação contra a fome em Copacabana Desde 2021, a Ação da Cidadania incorporou a confecção de refeições ao projeto, que começou realizando campanhas e distribuindo gêneros alimentícios. Outra iniciativa recente é o banco de alimentos, que completa um ano este mês, tendo doado cerca de cem toneladas de frutas, legumes e verduras produzidos na horta da Gamboa e de pequenos produtores. Somando todas as ações, desde 1993 a ONG contabiliza 57 mil toneladas de alimentos doados em todo o Brasil. — Imagina uma pessoa que está em casa sem o que comer. Acha que ela tem capacidade de estudar e de concorrer por uma vaga de emprego de igual para igual com outra que se alimenta? A Pirâmide de Maslow coloca na base da sobrevivência do ser humano respirar, beber e comer. Sem esses três elementos não se consegue ter educação, saúde, um meio ambiente sustentável nem democracia. Então, a fome é uma das coisas básicas a serem resolvidas — afirma Rodrigo Afonso, diretor executivo da ONG. 'Uma ajuda e tanto' A CasaNem, que abriga 20 pessoas LGBTQIAPN+, no Flamengo, é uma das instituições que recebem refeições da Ação da Cidadania. Para o grupo, o cardápio é especial: vegano, a pedido da coordenadora Indianarae Siqueira. Também são entregues à casa produtos do banco de alimentos, compartilhados com cerca de 500 vulneráveis. Uma ajuda e tanto, segundo Juliel Duarte Lima, que mora na CasaNem. — Sou pós-graduada em engenharia de software, mas tenho dificuldade de arranjar emprego por ser trans. Há muito preconceito — lamenta Juliel, que junto com Indianarae, Daniela Faria e Lorrana Siqueira receberam, na semana passada passada, os alimentos doados. Juliel, Indianarae, Lorrana e Daniela, que vivem
Ação da Cidadania já distribuiu 57 mil toneladas de alimentos; na Rocinha, Família na Mesa doa cestas básicas e produtos que busca na Ceasa O tamanho do caldeirão — que comporta 35 quilos de feijão e é usado duas vezes por dia — e a capacidade das três câmaras frigoríficas — cada uma pode acondicionar dez toneladas de alimentos — dão a dimensão da produção da cozinha solidária da Ação da Cidadania, instalada num contêiner ao lado galpão da ONG, na Gamboa, na Zona Portuária do Rio, onde acontecem os eventos paralelos do G20. Ali, são preparadas mil refeições por dia, de segunda a sexta-feira, metade para o almoço e o restante para o jantar de pessoas que não têm o que comer. Batucada boa, cerveja gelada e paquera: visitantes desfrutam das atrações do Rio e tentam a sorte de encontrar um amor no G20 Atiradores de elite, militares e cães farejadores: presença de chefes de Estado e delegações muda rotina de hotéis do Rio O combate à fome, à desigualdade e à pobreza é um dos temas da Cúpula de Líderes da conferência internacional. Assim como é o foco da Ação da Cidadania, fundada há 31 anos por Herbert de Souza, o Betinho, e de outras organizações da sociedade civil como Família na Mesa, Favela Orgânica, Quilombo Aquilah e Instituto de Medicina e Cidadania (IMC). — O meu coração fica quentinho de saber que estou alimentando tanta gente com meu trabalho — diz a cozinheira Lidiane Sena, moradora do Morro da Providência e uma das encarregadas de preparar as quentinhas da Ação da Cidadania. — A minha comunidade também recebe os kits (além da refeição, inclui talheres descartáveis, água mineral e uma fruta). Tem gente que me para e diz que a comida estava bonita e gostosa. Cozinheiros da Ação da Cidadania preparam alimentos: ONG distribui mil refeições por dia Beatriz Orle Insegurança alimentar A urgência de iniciativas para enfrentar a insegurança alimentar grave pode ser medida. Pesquisa concluída este ano pelo Instituto de Nutrição da UFRJ, em parceria com a Câmara Municipal, revela que, no Rio, 489 mil pessoas (quase 8% da população) vivem com apenas uma refeição diariamente ou passam um dia inteiro sem comer. Já dados mais recentes do IBGE, de 2022, informam que mais de um quarto da população fluminense (26,6%) tem renda familiar per capita de até US$ 6,89 (R$ 40). O estado é também o quarto mais desigual entre as 27 unidades da federação (índice Gini/2023). — O Rio é a cidade partida visível a olho nu. Apresenta níveis de desigualdade superiores aos do Brasil, um país grande, diverso e conhecido pela alta desigualdade — analisa o economista Marcelo Neri, do FGV Social. Fechamento: Atlântica será interditada em dias de reunião do G20 a pedido das forças de segurança Pratos com cruzes Neste sábado, a Ação da Cidadania e o Rio de Paz promoveram manifestação contra a fome na faixa de areia em frente ao Copacabana Palace. Foram instalados 733 pratos vazios pintados com cruzes vermelhas. Cada prato representou um milhão de pessoas que passam fome no mundo, segundo dados da ONU. O ato chamou a atenção de cariocas e turistas. — No meu trabalho, tenho contato direto com crianças que não têm o que comer — lamenta a assistente social Aline Carla Pereira, de Ituverava, no interior de São Paulo. Ato na areia: Rio de Paz e Ação da Cidadania fazem manifestação contra a fome em Copacabana Desde 2021, a Ação da Cidadania incorporou a confecção de refeições ao projeto, que começou realizando campanhas e distribuindo gêneros alimentícios. Outra iniciativa recente é o banco de alimentos, que completa um ano este mês, tendo doado cerca de cem toneladas de frutas, legumes e verduras produzidos na horta da Gamboa e de pequenos produtores. Somando todas as ações, desde 1993 a ONG contabiliza 57 mil toneladas de alimentos doados em todo o Brasil. — Imagina uma pessoa que está em casa sem o que comer. Acha que ela tem capacidade de estudar e de concorrer por uma vaga de emprego de igual para igual com outra que se alimenta? A Pirâmide de Maslow coloca na base da sobrevivência do ser humano respirar, beber e comer. Sem esses três elementos não se consegue ter educação, saúde, um meio ambiente sustentável nem democracia. Então, a fome é uma das coisas básicas a serem resolvidas — afirma Rodrigo Afonso, diretor executivo da ONG. 'Uma ajuda e tanto' A CasaNem, que abriga 20 pessoas LGBTQIAPN+, no Flamengo, é uma das instituições que recebem refeições da Ação da Cidadania. Para o grupo, o cardápio é especial: vegano, a pedido da coordenadora Indianarae Siqueira. Também são entregues à casa produtos do banco de alimentos, compartilhados com cerca de 500 vulneráveis. Uma ajuda e tanto, segundo Juliel Duarte Lima, que mora na CasaNem. — Sou pós-graduada em engenharia de software, mas tenho dificuldade de arranjar emprego por ser trans. Há muito preconceito — lamenta Juliel, que junto com Indianarae, Daniela Faria e Lorrana Siqueira receberam, na semana passada passada, os alimentos doados. Juliel, Indianarae, Lorrana e Daniela, que vivem na CasaNem (a partir da esquerda): instituição recebe refeições, frutas e legumes da Ação da Cidadania Beatriz Orle Cestas básicas e feirinha na Rocinha Na Rocinha, um padeiro, nascido e criado na comunidade, botou literalmente a mão na massa. Em 2018, Marcelo Santos criou o Família na Mesa. No começo, entregava duas cestas com alimentos não perecíveis. Ele correu atrás de parceiros e, hoje, conseguiu um espaço para abrigar a ONG no Ciep Ayrton Senna, de frente para a comunidade, e distribui cestas a cem famílias de Rocinha, Vidigal e Parque da Cidade. Santos promove ainda mensalmente uma feirinha doando mercadorias que busca no Ceasa, além de festas, em épocas festivas como Natal e Dia das Crianças. Marcelo Santos: além de alimentos, Marcelo Santos distribuiu brinquedos para crianças da Rocinha no Natal de 2023 Divulgação/Redes Sociais — Vi gente passando fome, senti necessidade de alimentar essas pessoas e fui em busca de ajuda — conta. — Nunca passei fome, só aperto. Já trabalhei até em sinal de trânsito. Moradora da Via Ápia, na Rocinha, a cearense Francisca Lima é uma das beneficiadas com cestas básicas. — Não tenho filhos, e a cesta dá para o mês todo. A comida está muito cara. Quando eu era criança, meus pais lutavam com dificuldade. A gente não passava fome, mas era café com farinha, de manhã, e feijão com farinha no almoço e no jantar. Tinha arroz de vez em quando, só que nem sempre tinha óleo para temperar. E carne de segunda era uma vez por semana — recorda ela, que trabalha em outro projeto social criado por Santos, produzindo, através da reciclagem de óleo usado, sabão em barra e em pasta, desinfetante e detergente, que são vendidos. G20: Príncipe da Arábia Saudita oferece banquete real no Copacabana Palace Nada vai para o lixo Em outra comunidade da Zona Sul, a Babilônia, no Leme, a iniciativa da moradora Regina Tchelly, de 43 anos, faz sucesso. Paraibana de Serraria, ela chegou no Rio com 19 anos e começou a trabalhar como empregada doméstica. Na Babilônia, a convivência com vizinhos que passavam necessidades levou Regina a lembrar dos ensinamentos de sua mãe e de sua avó, que nada descartavam do alimento. Nasceu, então, o Favela Orgânica, com aulas gratuitas. — Combato a fome e o desperdício de alimentos ensinando as pessoas. Ensino o aproveitamento até do talo e a criar hortas em pequenos espaços — diz ela, que tem receitas inovadoras, como a do arroz colorido de talos e cascas, a do quiche de talo de brócolis e a do sal de semente de mamão. Regina Tchelly, que criou o Favela Orgânica: nada vai para o lixo Divulgação/Redes Sociais Fundado há 13 anos, o projeto conta com o apoio da Secretaria da Mulher, do município, e hoje tem 160 alunas de várias comunidades. Suas receitas também viraram uma publicação, que conquistou o Prêmio Jabuti de melhor livro do ano na categoria Economia Criativa, em 2022. — Esse curso é um presente. Tem nutricionista e até folha com gosto de peixe — afirma a aposentada Selma Corrêa, de 62 anos, aluna e moradora do Chapéu Mangueira, que nasceu no morro e chegou a passar fome na infância. Da Zona Sul para a Zona Oeste, em Jacarepaguá, o exemplo vem de Hosania Nascimento, neta de indígena, casada com português, que teve um filho mameluco, que se casou com uma mulher preta. Nascida na Colônia Curupaiti, implantou ali o Quilombo Aquilah, há 30 anos. Mas a ideia de combater a fome surgiu durante a pandemia de Covid-19. Com o apoio de patrocinadores, como o Instituto Phi (Filantropia Inteligente), montou cursos para que mulheres de Curupaiti e outras cinco comunidades vizinhas possam aprender como aproveitar folhas, talos e frutas para confeccionar alimentos e fitoterápicos. Hoje, há aproximadamente 400 mulheres matriculadas. Mulheres que participam de aulas no Quilombo Aquilah sobre o aproveitamento de alimentos Divulgação — A jaqueira é uma poderosa fonte de alimento. A gente pode fazer salgadinhos, carne de jaca... Quem não sabe, pensa que está comendo frango — conta Hosania.— Da minha avó indígena, aprendi muito da medicina natural, a cura por meio das ervas e plantas que a gente tem no nosso quintal. Atendimento de saúde Médico Felix Zyngier atende paciente na comunidade Morro Azul, no Flamengo Divulgação Já o IMC foi fundado por profissionais de saúde (entre médicos, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas e fisioterapeutas). todos voluntários, que há oito anos passaram a dar consultas em salas das associações de moradores três comunidades: Morro Azul (Flamengo), Tavares Bastos (Catete) e Parque da Cidade (Gávea). Alguns pacientes são encaminhados pelo clínico para o atendimento do especialista em seus consultórios, com hora marcada e gratuitamente. O IMC fundou ainda uma biblioteca no Morro Azul e tem planos para o futuro. — Queremos sair um pouco do assistencialismo. Vamos ajudar essas três comunidades, oferecendo cursos de capacitação de cuidadores de autistas e idosos e de informática — anuncia o diretor-executivo Cláudio Vieira.
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