MPSP recorre de decisão que anulou penas de 74 PMs condenados por executar presos durante o Massacre do Carandiru
Ministério Público alega inconstitucionalidade na ação da Justiça de São Paulo, que considerou indulto editado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) válido O Ministério Público de São Paulo (MPSP) informou que recorreu da decisão do Tribunal de Justiça que anulou todas as penas dos 74 agentes da Polícia Militar condenados por executarem a tiros 77 presos durante o Massacre do Carandiru, em 1992. No recurso, o órgão alega que o indulto neste caso é inconstitucional. Sem monitoramento da Meta: influencers mirins seguem com divulgação de jogos de azar no Instagram Amor diverso: Adoção de crianças por casais homoafetivos triplica em quatro anos A extinção da pena pelo TJSP, publicada este mês, ocorreu após a Justiça considerar constitucional o indulto editado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que livrou os agentes envolvidos no caso. No recurso do MPSP, no entanto, o promotor de Justiça Mauricio Antonio Ribeiro Lopes afirmou que o indulto natalino concedido não abrange crimes "praticados mediante grave ameaça ou violência contra a pessoa ou com violência doméstica e familiar contra a mulher". "Assim, estaria, como está, impedido o Tribunal de Justiça de São Paulo reconhecer, no mérito, a aplicabilidade do indulto ao caso em debate", concluiu o Ministério Público. Veja vídeo: Doutorando negro diz ser vítima de racismo na USP: 'passava os dedos na boca, no nariz e cuspia no chão' Na decisão publicada na última quarta-feira (2), o relator Roberto Porto, da 4ª Câmara de Direito Criminal do TJSP, extinguiu as condenações dos policiais militares. Assim, as penas deles, que iam de 48 anos a 624 anos de prisão, também foram perdoadas. O induto foi editado na reta final do mandato de Bolsonaro em 2022 e previu o perdão para policiais condenados, ainda que provisoriamente, “por fato praticado há mais de 30 anos” que “não era considerado hediondo no momento de sua prática” — uma redação que se aplicava justamente ao caso do massacre do Carandiru. Em janeiro de 2023, entretanto, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu liminarmente esse trecho do decreto. De acordo com a advogada Priscila Akemi Beltrame, vice-presidente da comissão de direitos humanos da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), a decisão do Tribunal de Justiça viola os direitos humanos por ignorar a brutalidade com a qual os detentos foram assassinados durante o episódio. — É uma decisão desastrosa para quem busca a realização dos direitos humanos da população vulnerável, especialmente da carcerária. Entendo que há dificuldade de individualização de cada conduta dos agentes, no contexto da condenação, mas acredito que a decisão revela um racismo do sistema de justiça, que aceita as mortes de pessoas custodiadas como se fossem banais — comenta Beltrame. Nenhuma punição Mais de 30 anos após o massacre, nenhum policial cumpriu um dia sequer de pena pelo ocorrido. Em novembro de 2022, um mês antes de Bolsonaro editar o decreto de indulto, o TJSP havia começado a decidir as penas dos 69 policiais militares ainda vivos, mas foi suspenso por pedido de vista (mais tempo para analisar o processo). A ideia era retomar o caso “com brevidade”, mas veio o indulto, criando um novo impasse para o processo. Initial plugin text A Procuradoria-Geral da República (PGR), na época sob a gestão Augusto Aras, ajuizou uma ação no Supremo contra o decreto de Bolsonaro, e em janeiro Weber suspendeu a aplicação do trecho do indulto que beneficiaria militares do Carandiru. A decisão está valendo até agora. Em abril de 2023, o Órgão Especial do TJSP analisou uma arguição de inconstitucionalidade do indulto, e decidiu esperar uma decisão definitiva do STF. Assim, mesmo com a liminar afastando a aplicação do indulto, os desembargadores decidiram que não poderiam prosseguir com o julgamento das penas dos policiais condenados. Em junho deste ano, entretanto, o ministro Luiz Fux, atual relator do caso no STF, determinou que a Corte paulista seguisse com o julgamento da arguição, em vez de esperar pelo Supremo. O julgamento ocorreu nesta quarta, de forma reservada, e o indulto foi considerado constitucional. Essa arguição de inconstitucionalidade no TJSP tramita de forma sigilosa, o que é incomum para ações do tipo. O tribunal não respondeu o motivo do sigilo. Agora, o caso voltará para a 4ª Câmara Criminal, que apenas deve aplicar a decisão do Órgão Especial e livrar os PMs de cumprir penas. O Ministério Público de São Paulo (MPSP) deve aguardar esse julgamento e, a depender do que for definido, irá recorrer ou aguardar o Supremo julgar o caso. Há a possibilidade, entretanto, do STF julgar a ação que questiona o indulto em definitivo de forma diferente, ou seja, o Supremo poderia declarar o decreto de Bolsonaro inconstitucional. Ocorre que ainda não há previsão de quando o caso será pautado. Também não há previsão de quando o TJSP julgará as penas dos condenados. Por trás do indulto, há uma questão jurídica a ser analisada de forma inédita
Ministério Público alega inconstitucionalidade na ação da Justiça de São Paulo, que considerou indulto editado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) válido O Ministério Público de São Paulo (MPSP) informou que recorreu da decisão do Tribunal de Justiça que anulou todas as penas dos 74 agentes da Polícia Militar condenados por executarem a tiros 77 presos durante o Massacre do Carandiru, em 1992. No recurso, o órgão alega que o indulto neste caso é inconstitucional. Sem monitoramento da Meta: influencers mirins seguem com divulgação de jogos de azar no Instagram Amor diverso: Adoção de crianças por casais homoafetivos triplica em quatro anos A extinção da pena pelo TJSP, publicada este mês, ocorreu após a Justiça considerar constitucional o indulto editado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que livrou os agentes envolvidos no caso. No recurso do MPSP, no entanto, o promotor de Justiça Mauricio Antonio Ribeiro Lopes afirmou que o indulto natalino concedido não abrange crimes "praticados mediante grave ameaça ou violência contra a pessoa ou com violência doméstica e familiar contra a mulher". "Assim, estaria, como está, impedido o Tribunal de Justiça de São Paulo reconhecer, no mérito, a aplicabilidade do indulto ao caso em debate", concluiu o Ministério Público. Veja vídeo: Doutorando negro diz ser vítima de racismo na USP: 'passava os dedos na boca, no nariz e cuspia no chão' Na decisão publicada na última quarta-feira (2), o relator Roberto Porto, da 4ª Câmara de Direito Criminal do TJSP, extinguiu as condenações dos policiais militares. Assim, as penas deles, que iam de 48 anos a 624 anos de prisão, também foram perdoadas. O induto foi editado na reta final do mandato de Bolsonaro em 2022 e previu o perdão para policiais condenados, ainda que provisoriamente, “por fato praticado há mais de 30 anos” que “não era considerado hediondo no momento de sua prática” — uma redação que se aplicava justamente ao caso do massacre do Carandiru. Em janeiro de 2023, entretanto, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu liminarmente esse trecho do decreto. De acordo com a advogada Priscila Akemi Beltrame, vice-presidente da comissão de direitos humanos da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), a decisão do Tribunal de Justiça viola os direitos humanos por ignorar a brutalidade com a qual os detentos foram assassinados durante o episódio. — É uma decisão desastrosa para quem busca a realização dos direitos humanos da população vulnerável, especialmente da carcerária. Entendo que há dificuldade de individualização de cada conduta dos agentes, no contexto da condenação, mas acredito que a decisão revela um racismo do sistema de justiça, que aceita as mortes de pessoas custodiadas como se fossem banais — comenta Beltrame. Nenhuma punição Mais de 30 anos após o massacre, nenhum policial cumpriu um dia sequer de pena pelo ocorrido. Em novembro de 2022, um mês antes de Bolsonaro editar o decreto de indulto, o TJSP havia começado a decidir as penas dos 69 policiais militares ainda vivos, mas foi suspenso por pedido de vista (mais tempo para analisar o processo). A ideia era retomar o caso “com brevidade”, mas veio o indulto, criando um novo impasse para o processo. Initial plugin text A Procuradoria-Geral da República (PGR), na época sob a gestão Augusto Aras, ajuizou uma ação no Supremo contra o decreto de Bolsonaro, e em janeiro Weber suspendeu a aplicação do trecho do indulto que beneficiaria militares do Carandiru. A decisão está valendo até agora. Em abril de 2023, o Órgão Especial do TJSP analisou uma arguição de inconstitucionalidade do indulto, e decidiu esperar uma decisão definitiva do STF. Assim, mesmo com a liminar afastando a aplicação do indulto, os desembargadores decidiram que não poderiam prosseguir com o julgamento das penas dos policiais condenados. Em junho deste ano, entretanto, o ministro Luiz Fux, atual relator do caso no STF, determinou que a Corte paulista seguisse com o julgamento da arguição, em vez de esperar pelo Supremo. O julgamento ocorreu nesta quarta, de forma reservada, e o indulto foi considerado constitucional. Essa arguição de inconstitucionalidade no TJSP tramita de forma sigilosa, o que é incomum para ações do tipo. O tribunal não respondeu o motivo do sigilo. Agora, o caso voltará para a 4ª Câmara Criminal, que apenas deve aplicar a decisão do Órgão Especial e livrar os PMs de cumprir penas. O Ministério Público de São Paulo (MPSP) deve aguardar esse julgamento e, a depender do que for definido, irá recorrer ou aguardar o Supremo julgar o caso. Há a possibilidade, entretanto, do STF julgar a ação que questiona o indulto em definitivo de forma diferente, ou seja, o Supremo poderia declarar o decreto de Bolsonaro inconstitucional. Ocorre que ainda não há previsão de quando o caso será pautado. Também não há previsão de quando o TJSP julgará as penas dos condenados. Por trás do indulto, há uma questão jurídica a ser analisada de forma inédita pelo STF, conforme apontado por Rosa Weber ao julgar a liminar: se a proibição constitucional de indulto para crimes hediondos vale para delitos que não eram considerados hediondos na época do cometimento — homicídios só entraram nessa classificação em 1994. Não será a primeira vez, porém, que a Corte analisará indultos concedidos por presidentes. Em 2019, o plenário validou o indulto de Michel Temer (MDB) de 2017 a presos por crimes do colarinho branco. Vaivém no processo Esse é apenas mais um episódio de uma novela de mais de três décadas no processo do Carandiru, que teve início em 1996 na Justiça comum — antes disso, a ação vinha tramitando na Justiça Militar. O processo foi longo: houve dificuldade para ter laudos confiáveis, já que a cena não havia sido devidamente preservada, e o principal problema foi a necessidade de individualização das condutas de cada policial no dia do massacre. Entre 2013 e 2014, os policiais foram enfim julgados (e considerados culpados) pelo tribunal do júri, mas todos responderam ao processo em liberdade. Ao fim, 74 agentes foram condenados por homicídio, com penas que variavam de 48 a 624 anos. Mas essa definição durou pouco. A defesa dos policiais recorreu e, em 2016, o TJSP anulou as penas de todos os policiais condenados, sob o argumento de que não era possível saber como cada policial agiu na Casa de Detenção no dia 2 de outubro de 1992. Na época, o desembargador Ivan Sartori, relator, chegou a dizer durante o julgamento que "não houve massacre” e sim uma “contenção necessária à imposição da ordem e da disciplina". O tribunal mandou fazer novos júris, entretanto recursos do Ministério Público levaram o caso às últimas instâncias. O STJ restabeleceu a condenação em 2021 e, em 2022, o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, negou um recurso da defesa dos policiais e determinou o retorno do processo ao Tribunal de Justiça para definição das penas. O advogado Eliezer Pereira Martins, que defende todos os réus no processo, afirmou ao GLOBO em janeiro que os agentes só cumpriram ordens e destaca que ninguém do comando da Polícia Militar ou do governo do estado foi condenado. O coronel da PM Ubiratan Guimarães, que comandou a invasão ao Carandiru que terminou com 111 mortos, foi absolvido em 2006.
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