Lisa Ginzburg e Ana Margarida de Carvalho discutem solidariedade feminina e a força da fantasia na Flip

A oitava mesa da Festa Literária reuniu autoras europeias apaixonadas pelo Brasil PARATY - A mesa "A paz e o gesto", oitava da programação principal da Festa Literária Internacional de Paraty, reuniu as escritoras Lisa Ginzburg, da Itália, e Ana Margarida de Carvalho, de Portugal, na manhã desta quarta-feira. Com mediação de Adriana Ferreira da Silva, o debate girou em torno de temas como a solidariedade feminina, a força da fantasia em suas obras e a paixão de ambas pelo Brasil. A mediadora notou que, no trabalho de Ginzburg, os lugares também são personagens. Ficcionais ou não, as cidades e vilarejos descritos por ela em seus livros têm protagonismo nas histórias. A italiana, que morou em diferentes países (inclusive no Brasil), disse que sua experiência pessoal impulsionou a importância da geografia em sua obra. – Tenho uma raiz diaspórica por história familiar – disse Lisa. - Minha imaginação tende a inventar lugares. Quando escrevo, é como se eu fosse pra esse lugar que inventei. Os personagens por vezes vivem em lugares diferentes, e isso faz com que as relações afetivas sejam atrapalhadas ou ajudadas pela distância. Bom, estou falando disso na terra da saudade. Sabem como ela pode afetar ou até romper uma relação. Na minha obra a distância como algo que consolida, mas também afasta. Em Cara paz (Nós, 2023), Lisa descreve com intensidade os laços afetivos que unem as irmãs Nina e Madalena, abandonadas pela mãe. Ela disse que desejava escrever sobre a amizade entre mulheres, e que se inspirou em pequenos momentos da vida real para compor a história. Acredito muito no poder da fantasia e do destino. Peguei um taxi compartilhado com duas estrangeiras. Elas eram super amigas, contaram historia toda de suas vidas. Eu reparei nessa sincronicidade, como o Jung falaria. Estava pensando em um enredo, encontrei um enredo na vida real. São sinais que vão chegando. A fantasia antecipa as coisas, de certa forma. Em dado momento, o sistema de tradução parou de funcionar e a escritora italiana passou a falar em um fluente português, que aprendeu quando viveu aqui. Ela foi bastante aplaudida ao falar na língua local e se dizer apaixonada por Clarice Lispector. Ana Margarida, por sua vez, revelou que sua introdução à cultura brasileira se deu através da música popular e da literatura. As duas escritoras têm obras que se passam no Brasil. – Meu pai não me deixava ver as novelas. Eu não pude ver "Gabriela", mas pude ler o livro de Jorge Amado muito precocemente e foi uma explosão para mim. Quando vi o concerto do Chico Buarque, eu senti a alegria de toda a gente meu redor. Lembro do pensamento de criança que tive: isto é vida. Lisboeta, Ana Margarida atuou no jornalismo durante 25 anos. Além de reportagens, publicou crônicas, ensaios e críticas de cinema e literatura. Romancista e contista, ela também escreve teatro. Seu romance mais recente a ser publicado no Brasil é "O gesto que fazemos para proteger a cabeça", de 2019, publicado este ano pela Editora Dublinense por aqui, que tem a guerra civil espanhola como tema de fundo. – Escritores têm que estar permanentemente sob efeito do assombro, da curiosidade. E devem deixar-se contaminar, às vezes, até pelas pequenas coisas. Qualquer coisinha. Somos uma espécie de vampiro, vamos sugando as coisas que podem nos servir. Tenho que anotar, pois a minha memória é porosa.

Oct 12, 2024 - 02:28
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Lisa Ginzburg e Ana Margarida de Carvalho discutem solidariedade feminina e a força da fantasia na Flip

A oitava mesa da Festa Literária reuniu autoras europeias apaixonadas pelo Brasil PARATY - A mesa "A paz e o gesto", oitava da programação principal da Festa Literária Internacional de Paraty, reuniu as escritoras Lisa Ginzburg, da Itália, e Ana Margarida de Carvalho, de Portugal, na manhã desta quarta-feira. Com mediação de Adriana Ferreira da Silva, o debate girou em torno de temas como a solidariedade feminina, a força da fantasia em suas obras e a paixão de ambas pelo Brasil. A mediadora notou que, no trabalho de Ginzburg, os lugares também são personagens. Ficcionais ou não, as cidades e vilarejos descritos por ela em seus livros têm protagonismo nas histórias. A italiana, que morou em diferentes países (inclusive no Brasil), disse que sua experiência pessoal impulsionou a importância da geografia em sua obra. – Tenho uma raiz diaspórica por história familiar – disse Lisa. - Minha imaginação tende a inventar lugares. Quando escrevo, é como se eu fosse pra esse lugar que inventei. Os personagens por vezes vivem em lugares diferentes, e isso faz com que as relações afetivas sejam atrapalhadas ou ajudadas pela distância. Bom, estou falando disso na terra da saudade. Sabem como ela pode afetar ou até romper uma relação. Na minha obra a distância como algo que consolida, mas também afasta. Em Cara paz (Nós, 2023), Lisa descreve com intensidade os laços afetivos que unem as irmãs Nina e Madalena, abandonadas pela mãe. Ela disse que desejava escrever sobre a amizade entre mulheres, e que se inspirou em pequenos momentos da vida real para compor a história. Acredito muito no poder da fantasia e do destino. Peguei um taxi compartilhado com duas estrangeiras. Elas eram super amigas, contaram historia toda de suas vidas. Eu reparei nessa sincronicidade, como o Jung falaria. Estava pensando em um enredo, encontrei um enredo na vida real. São sinais que vão chegando. A fantasia antecipa as coisas, de certa forma. Em dado momento, o sistema de tradução parou de funcionar e a escritora italiana passou a falar em um fluente português, que aprendeu quando viveu aqui. Ela foi bastante aplaudida ao falar na língua local e se dizer apaixonada por Clarice Lispector. Ana Margarida, por sua vez, revelou que sua introdução à cultura brasileira se deu através da música popular e da literatura. As duas escritoras têm obras que se passam no Brasil. – Meu pai não me deixava ver as novelas. Eu não pude ver "Gabriela", mas pude ler o livro de Jorge Amado muito precocemente e foi uma explosão para mim. Quando vi o concerto do Chico Buarque, eu senti a alegria de toda a gente meu redor. Lembro do pensamento de criança que tive: isto é vida. Lisboeta, Ana Margarida atuou no jornalismo durante 25 anos. Além de reportagens, publicou crônicas, ensaios e críticas de cinema e literatura. Romancista e contista, ela também escreve teatro. Seu romance mais recente a ser publicado no Brasil é "O gesto que fazemos para proteger a cabeça", de 2019, publicado este ano pela Editora Dublinense por aqui, que tem a guerra civil espanhola como tema de fundo. – Escritores têm que estar permanentemente sob efeito do assombro, da curiosidade. E devem deixar-se contaminar, às vezes, até pelas pequenas coisas. Qualquer coisinha. Somos uma espécie de vampiro, vamos sugando as coisas que podem nos servir. Tenho que anotar, pois a minha memória é porosa.

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