Após cancelar turnê no auge, Shawn Mendes lança álbum que explora a crise: ‘Dá para se curar e se expressar ao mesmo tempo’
Astro pop canadense de 26 anos havia encerrado carreira no que chamou de 'ponto de ruptura' de 2022 Em uma noite chuvosa de verão, no palco de um clube em Woodstock, Nova York, Shawn Mendes estava a ponto de derramar lágrimas de emoção. “Há uma grande chance de eu chorar muito”, disse o cantor e compositor à pequena multidão. Depois, esfregou as costas das mãos nos olhos e sorriu. Raio X: Pesquisa da Flup mapeia hábitos de leitura nas periferias do Rio e aponta 'demanda reprimida' por livros The Cure: Robert Smith volta aos palcos com preços acessíveis para a 'família' de fãs Foi a primeira vez em mais de dois anos que Mendes, o astro pop canadense de 26 anos, se apresentou para uma plateia, depois que, abruptamente, encerrou sua carreira ainda no auge. Em 2022, em meio ao que ele chamou de “ponto de ruptura” de sua saúde mental, interrompeu uma turnê internacional — cancelando mais de 80 datas programadas em grandes arenas. Mendes é um fenômeno das redes — com jeito de modelo e propensão constante para mostrar o peito nu. Chegou ao sucesso imediato nas paradas musicais quando ainda era adolescente. Mas surpreendeu a todos quando se afastou quase completamente da música e foi em busca de maior estabilidade emocional. Depois de algum tempo, lentamente, voltou a escrever canções e falar da selva que é para ele a vida adulta. Com guitarra e cordas, expôs suas lutas pessoais em seu quinto álbum, “Shawn”, que chega na próxima sexta-feira. “Não entendo quem sou agora”, sussurra na angustiada faixa de abertura. Mas, nos poucos meses seguintes àquele show, os palcos de Mendes cresceram exponencialmente: o sucesso veio com “Nobody knows”, uma balada nova, apaixonada, que cantou no MTV Video Music Awards. A música termina com repiques de guitarra extasiados; depois, cantou para cem mil pessoas —em português, inclusive — no último Rock in Rio. Período sombrio Quando nos encontramos para uma entrevista, parecia ter recuperado a memória muscular do que significa ser uma estrela, embora a usasse com leveza. Estávamos em seu estúdio de gravação favorito na bucólica Rhinebeck, no estado de Nova York, onde ele havia trabalhado o novo álbum. Era a tarde do dia seguinte ao Video Music Awards. Se ele passou a noite festejando, não parecia. Sentado em uma cadeira de madeira na varanda com vista para colinas ondulantes e para um gramado incomum, Mendes usava uma camiseta que deixava à mostra suas tatuagens — “Good Boy”, diz uma delas. Durante a conversa, bebeu água e perguntou se me importaria se ele fumasse. E em seguida, sem hesitar, mergulhou no período mais sombrio e mais difícil de sua vida. Faz tempo que Mendes revelou seus episódios de desespero. Seu hit de 2018 “In my blood” fala como ficou congelado no chão de um banheiro, implorando por ajuda. Na música, ele encontra dentro de si a força para seguir. Na vida real, foi amparado por uma rede de amigos. Mendes está na estrada desde que saiu da casa de seus pais, em Pickering, Ontário, como uma estrela de 15 anos do Vine, a extinta plataforma de microvídeos. O auge de sua adolescência coincidiu com a fama global, e ele teve pouco espaço para refletir sobre qualquer uma das mudanças sísmicas por que passou: — Os primeiros dez anos de minha carreira foram rápidos demais. Nunca consegui acompanhar de fato cada momento. Seu romance com a pop star Camila Cabello, cativou o público — tanto quanto o rompimento. Aos 23 anos, tinha cerca de 80 pessoas na folha de pagamento de sua turnê e o peso da atenção do mundo sobre ele. Em 2022, conta que estava “severamente deprimido” e, após sete shows, interrompeu sua turnê. De repente, sentiu desejo de beber e fumar antes das apresentações, algo que, para proteger a voz, jurara não fazer. Foi então que percebeu que estava em um caminho que não queria seguir: — Pensei: “Não vou reescrever a mesma história que já foi escrita, de artistas que não conseguem lidar com a própria vida e começam a consumir mais drogas e mais álcool, até que tudo é demais. Não estou a fim de fazer isso.” Foi uma escolha dolorosa: “Meu coração se partiu quando cancelei a turnê/ Minha alma e minha cabeça estavam indo e voltando”, ele canta logo na faixa de abertura do novo álbum, chamada “Who I Am”. Em toda a carreira, Mendes só havia cancelado um show antes, por causa de uma laringite. Temia decepcionar os fãs e dispensar as pessoas de sua equipe, algumas das quais estavam com ele desde o início. Scott Harris, o principal parceiro musical e produtor de Mendes, comentou que a decisão foi crítica: —Ele precisou de muita fé e muita confiança para fazer o que era melhor para ele naquele momento. Em entrevistas, colaboradores, empresários e Imran Majid, CEO associado da Island Records, gravadora do cantor, declararam que a prioridade era o bem-estar de Mendes, não sua carreira (o cálculo é que o cancelamento da turnê representou US$ 100 milhões a menos para todos os envolvidos). Conforme a neblina mental se dissipava, Mendes fez várias viagens: Costa Rica, Quênia e
Astro pop canadense de 26 anos havia encerrado carreira no que chamou de 'ponto de ruptura' de 2022 Em uma noite chuvosa de verão, no palco de um clube em Woodstock, Nova York, Shawn Mendes estava a ponto de derramar lágrimas de emoção. “Há uma grande chance de eu chorar muito”, disse o cantor e compositor à pequena multidão. Depois, esfregou as costas das mãos nos olhos e sorriu. Raio X: Pesquisa da Flup mapeia hábitos de leitura nas periferias do Rio e aponta 'demanda reprimida' por livros The Cure: Robert Smith volta aos palcos com preços acessíveis para a 'família' de fãs Foi a primeira vez em mais de dois anos que Mendes, o astro pop canadense de 26 anos, se apresentou para uma plateia, depois que, abruptamente, encerrou sua carreira ainda no auge. Em 2022, em meio ao que ele chamou de “ponto de ruptura” de sua saúde mental, interrompeu uma turnê internacional — cancelando mais de 80 datas programadas em grandes arenas. Mendes é um fenômeno das redes — com jeito de modelo e propensão constante para mostrar o peito nu. Chegou ao sucesso imediato nas paradas musicais quando ainda era adolescente. Mas surpreendeu a todos quando se afastou quase completamente da música e foi em busca de maior estabilidade emocional. Depois de algum tempo, lentamente, voltou a escrever canções e falar da selva que é para ele a vida adulta. Com guitarra e cordas, expôs suas lutas pessoais em seu quinto álbum, “Shawn”, que chega na próxima sexta-feira. “Não entendo quem sou agora”, sussurra na angustiada faixa de abertura. Mas, nos poucos meses seguintes àquele show, os palcos de Mendes cresceram exponencialmente: o sucesso veio com “Nobody knows”, uma balada nova, apaixonada, que cantou no MTV Video Music Awards. A música termina com repiques de guitarra extasiados; depois, cantou para cem mil pessoas —em português, inclusive — no último Rock in Rio. Período sombrio Quando nos encontramos para uma entrevista, parecia ter recuperado a memória muscular do que significa ser uma estrela, embora a usasse com leveza. Estávamos em seu estúdio de gravação favorito na bucólica Rhinebeck, no estado de Nova York, onde ele havia trabalhado o novo álbum. Era a tarde do dia seguinte ao Video Music Awards. Se ele passou a noite festejando, não parecia. Sentado em uma cadeira de madeira na varanda com vista para colinas ondulantes e para um gramado incomum, Mendes usava uma camiseta que deixava à mostra suas tatuagens — “Good Boy”, diz uma delas. Durante a conversa, bebeu água e perguntou se me importaria se ele fumasse. E em seguida, sem hesitar, mergulhou no período mais sombrio e mais difícil de sua vida. Faz tempo que Mendes revelou seus episódios de desespero. Seu hit de 2018 “In my blood” fala como ficou congelado no chão de um banheiro, implorando por ajuda. Na música, ele encontra dentro de si a força para seguir. Na vida real, foi amparado por uma rede de amigos. Mendes está na estrada desde que saiu da casa de seus pais, em Pickering, Ontário, como uma estrela de 15 anos do Vine, a extinta plataforma de microvídeos. O auge de sua adolescência coincidiu com a fama global, e ele teve pouco espaço para refletir sobre qualquer uma das mudanças sísmicas por que passou: — Os primeiros dez anos de minha carreira foram rápidos demais. Nunca consegui acompanhar de fato cada momento. Seu romance com a pop star Camila Cabello, cativou o público — tanto quanto o rompimento. Aos 23 anos, tinha cerca de 80 pessoas na folha de pagamento de sua turnê e o peso da atenção do mundo sobre ele. Em 2022, conta que estava “severamente deprimido” e, após sete shows, interrompeu sua turnê. De repente, sentiu desejo de beber e fumar antes das apresentações, algo que, para proteger a voz, jurara não fazer. Foi então que percebeu que estava em um caminho que não queria seguir: — Pensei: “Não vou reescrever a mesma história que já foi escrita, de artistas que não conseguem lidar com a própria vida e começam a consumir mais drogas e mais álcool, até que tudo é demais. Não estou a fim de fazer isso.” Foi uma escolha dolorosa: “Meu coração se partiu quando cancelei a turnê/ Minha alma e minha cabeça estavam indo e voltando”, ele canta logo na faixa de abertura do novo álbum, chamada “Who I Am”. Em toda a carreira, Mendes só havia cancelado um show antes, por causa de uma laringite. Temia decepcionar os fãs e dispensar as pessoas de sua equipe, algumas das quais estavam com ele desde o início. Scott Harris, o principal parceiro musical e produtor de Mendes, comentou que a decisão foi crítica: —Ele precisou de muita fé e muita confiança para fazer o que era melhor para ele naquele momento. Em entrevistas, colaboradores, empresários e Imran Majid, CEO associado da Island Records, gravadora do cantor, declararam que a prioridade era o bem-estar de Mendes, não sua carreira (o cálculo é que o cancelamento da turnê representou US$ 100 milhões a menos para todos os envolvidos). Conforme a neblina mental se dissipava, Mendes fez várias viagens: Costa Rica, Quênia e Ruanda, local onde visitou o memorial do genocídio na capital. — O mundo é lindo e horrível. Isso mexe com sua perspectiva — disse. Ainda assim, dividindo seu tempo entre uma casa em Los Angeles e um condomínio em Toronto, Mendes levou um ano para colocar os pés de volta em um estúdio. — A gente estava escrevendo uma música e, no meio do caminho, ele dizia: “Sinto muito. Não consigo fazer isso” — lembrou o produtor e confidente Scott Harris. Gradualmente, com uma equipe de artistas da Geração Z como o compositor e produtor Mike Sabath, de 26 anos, eles chegaram lá. — Ele é como um raio de luz — comentou Sabath. Quebrando paredes O disco “Shawn” é manchado de desgosto e luxúria. Na balada “Why why why”, há uma referência incomum e vulnerável que relembra um susto que ele tomou ao saber de uma gravidez inesperada: “Pensei que estava prestes a ser pai/ Isso me abalou até o âmago, ainda sou uma criança/ Às vezes ainda choro por minha mãe”. Quando um colaborador sugeriu que usasse a experiência como tema para uma canção, Mendes hesitou. Depois refletiu melhor. — Se não é para falar de coisas complexas, porque fazer isso? Era também uma chance de quebrar qualquer parede que ainda existisse entre mim e as pessoas que me ouviam — lembrou. Em um show no Colorado no último dia 28, ele falou sobre sua sexualidade, enquanto apresentava uma música: “Cara, estou só descobrindo, como todo mundo. Algumas vezes não sei de verdade, outras vezes sei. É assustador”, afirmou, entre aplausos. Navegar pelos mesmos estágios de vida que seu público o tornou ainda mais querido pelos fãs. Na tarde ensolarada que passamos em Rhinebeck, com o canto dos pássaros e o cachorro do estúdio por perto, Mendes demonstrou preocupação com a maneira como suas revelações emocionais seriam recebidas. — Será que o público vai pensar que explorei demais minha história do cara triste, do cara que passou por algo difícil? — me perguntou. Depois, deu de ombros: — A cura leva tempo, mais do que você quer. Isso é lindo, porque você pode se curar e se expressar ao mesmo tempo. Você pode estar alegre e sofrendo simultaneamente.
Qual é a sua reação?