Exposição celebra o legado de Brígida Baltar no Museu de Arte do Rio
Artista morta em 2022 ganhou instituto para gerir seu acervo dirigido pelo filho Dois anos antes de morrer, em 2022, Brígida Baltar chamou o único filho, Tiago Baltar Simões, para uma conversa. A artista enfrentava uma leucemia há dez anos, sabia que não lhe restava muito tempo de vida e o perguntou se estava disposto a cuidar do seu acervo. Ele, um engenheiro sem relação profissional com as artes, aceitou a tarefa e recebeu uma recomendação: caso venha a achar, em algum momento, que não dá mais conta da incumbência, deve doar tudo a um museu. “É onde os artistas querem estar”, lhe disse Brígida. Artes: Expoente da Geração 80, Leda Catunda revisita a sua trajetória Perfil: Joana Vasconcelos faz sucesso na arte contemporânea com esculturas que exaltam o feminino Conheça Rose Afefé: A mulher que construiu sozinha uma cidade na Bahia Com a mãe ainda viva, eles começaram a trabalhar na organização dos itens e, auxiliados por amigos artistas e curadores, criaram o Instituto Brígida Baltar, do qual Tiago é diretor-geral. O desejo da artista carioca estava, então, plenamente contemplado. Já a vontade de permanecer dentro dos museus veio como consequência. A organização do acervo, que tem mais de mil obras, se desdobrou numa retrospectiva em cartaz no Museu de Arte do Rio até 5 de março. “Brígida Baltar: Pontuações” reúne cerca de 200 trabalhos, 50 deles inéditos. Apresentada como a maior exposição institucional dedicada à artista, a mostra reúne instalações, vídeos e fotografias produzidas desde a década de 1990. Entre as obras mais famosas, estão os registros de suas incursões por diferentes paisagens em que tenta coletar elementos como neblina, orvalho e maresia. Segundo o curador da retrospectiva e consultor do instituto, Marcelo Campos, trabalhos como estes fizeram de Brígida uma referência para muitos nomes que vieram depois. “Ela continuou uma tradição da presença feminina no vídeo, na arte brasileira, que tem Anna Bella Geiger e Letícia Parente como precursoras. E levou isso adiante, conforme artistas mais novos, como Yuri Firmeza e Waléria Américo, olharam para as suas criações”, ilustra. Um dos registros da série "Coletas" Divulgação Diretor da EAV Parque Lage, onde Brígida estudou e lecionou, Alberto Saraiva cita os mesmos trabalhos para dimensionar o ineditismo da produção da carioca, presente em coleções de instituições como Middlesbrough Institute of Modern Art (Mima), na Inglaterra; Museum of Contemporary Art of Cleveland, nos Estados Unidos; e Pinacoteca do Estado de São Paulo. A artista deu, segundo ele, um novo sentido à escultura. “Ela pensa em volume e consistência não apenas a partir de materiais passíveis de serem manipulados, como bronze, ferro e madeira. Faz isso usando uma materialidade fugidia, como a neblina, em que encontra um recipiente para guardá-la e dar forma àquilo”, comenta, em referência aos frascos de vidro usados na série “Coletas”. A exposição em cartaz no MAR é costurada por fragmentos de cadernos nos quais Brígida escreveu instruções sobre como suas obras deveriam ser montadas e administradas. Uma ideia sugerida pelo próprio Marcelo Campos, amigo de longa data. “Com a doença avançando, ela nos ligava e dizia: ‘Acho que não vou durar muito’. Mesmo assim, mantinha um vigor tanto no enfrentamento da leucemia quanto na consciência de lidar com o fim”, ele conta. “Num desses telefonemas, recomendei: ‘Pegue um caderno e escreva tudo o que tem vontade que seja feito’.” A obra "Torre" Divulgação Estão nesses escritos orientações sobre quem são as pessoas mais indicadas para montar determinadas obras e até novas descobertas sobre suas criações. Ela demonstra encanto, por exemplo, ao assistir, por vídeo, a uma palestra do escritor Ailton Krenak, em que ele diz que neblina, para os povos originários, tem sentido de cura. “Até o fim, ela observou em quais sentidos os trabalhos podiam tocar”, diz Marcelo. Diretor artístico do instituto e curador convidado da mostra, Jocelino Pessoa afirma que, diante de orientações tão detalhadas, Brígida tem uma presença muito marcada na retrospectiva. Por isso, o nome “Pontuações”. “Os desejos e a poética dela estão na exibição. Em vários momentos, durante a montagem, conseguíamos dizer o que ela ia gostar ou não”, comenta ele, adiantando que há outras duas exposições da carioca agendadas para os próximos dois anos. Um horizonte animador para Tiago, firme no propósito de levar adiante o legado da mãe. A tal história de doar o acervo para um museu, avisa, nem passa pela cabeça. “Vou cuidar de tudo isso enquanto conseguir. Ela tinha muito zelo pelas obras e me transmitiu isso de alguma forma”, comenta o filho, que fez questão de manter no quadro do instituto Ygor Landarin, assistente de Brígida desde 2017. “Ela sempre trabalhou mantendo a positividade e a paixão pelo que fazia. Foi uma lição muito importante.”
Artista morta em 2022 ganhou instituto para gerir seu acervo dirigido pelo filho Dois anos antes de morrer, em 2022, Brígida Baltar chamou o único filho, Tiago Baltar Simões, para uma conversa. A artista enfrentava uma leucemia há dez anos, sabia que não lhe restava muito tempo de vida e o perguntou se estava disposto a cuidar do seu acervo. Ele, um engenheiro sem relação profissional com as artes, aceitou a tarefa e recebeu uma recomendação: caso venha a achar, em algum momento, que não dá mais conta da incumbência, deve doar tudo a um museu. “É onde os artistas querem estar”, lhe disse Brígida. Artes: Expoente da Geração 80, Leda Catunda revisita a sua trajetória Perfil: Joana Vasconcelos faz sucesso na arte contemporânea com esculturas que exaltam o feminino Conheça Rose Afefé: A mulher que construiu sozinha uma cidade na Bahia Com a mãe ainda viva, eles começaram a trabalhar na organização dos itens e, auxiliados por amigos artistas e curadores, criaram o Instituto Brígida Baltar, do qual Tiago é diretor-geral. O desejo da artista carioca estava, então, plenamente contemplado. Já a vontade de permanecer dentro dos museus veio como consequência. A organização do acervo, que tem mais de mil obras, se desdobrou numa retrospectiva em cartaz no Museu de Arte do Rio até 5 de março. “Brígida Baltar: Pontuações” reúne cerca de 200 trabalhos, 50 deles inéditos. Apresentada como a maior exposição institucional dedicada à artista, a mostra reúne instalações, vídeos e fotografias produzidas desde a década de 1990. Entre as obras mais famosas, estão os registros de suas incursões por diferentes paisagens em que tenta coletar elementos como neblina, orvalho e maresia. Segundo o curador da retrospectiva e consultor do instituto, Marcelo Campos, trabalhos como estes fizeram de Brígida uma referência para muitos nomes que vieram depois. “Ela continuou uma tradição da presença feminina no vídeo, na arte brasileira, que tem Anna Bella Geiger e Letícia Parente como precursoras. E levou isso adiante, conforme artistas mais novos, como Yuri Firmeza e Waléria Américo, olharam para as suas criações”, ilustra. Um dos registros da série "Coletas" Divulgação Diretor da EAV Parque Lage, onde Brígida estudou e lecionou, Alberto Saraiva cita os mesmos trabalhos para dimensionar o ineditismo da produção da carioca, presente em coleções de instituições como Middlesbrough Institute of Modern Art (Mima), na Inglaterra; Museum of Contemporary Art of Cleveland, nos Estados Unidos; e Pinacoteca do Estado de São Paulo. A artista deu, segundo ele, um novo sentido à escultura. “Ela pensa em volume e consistência não apenas a partir de materiais passíveis de serem manipulados, como bronze, ferro e madeira. Faz isso usando uma materialidade fugidia, como a neblina, em que encontra um recipiente para guardá-la e dar forma àquilo”, comenta, em referência aos frascos de vidro usados na série “Coletas”. A exposição em cartaz no MAR é costurada por fragmentos de cadernos nos quais Brígida escreveu instruções sobre como suas obras deveriam ser montadas e administradas. Uma ideia sugerida pelo próprio Marcelo Campos, amigo de longa data. “Com a doença avançando, ela nos ligava e dizia: ‘Acho que não vou durar muito’. Mesmo assim, mantinha um vigor tanto no enfrentamento da leucemia quanto na consciência de lidar com o fim”, ele conta. “Num desses telefonemas, recomendei: ‘Pegue um caderno e escreva tudo o que tem vontade que seja feito’.” A obra "Torre" Divulgação Estão nesses escritos orientações sobre quem são as pessoas mais indicadas para montar determinadas obras e até novas descobertas sobre suas criações. Ela demonstra encanto, por exemplo, ao assistir, por vídeo, a uma palestra do escritor Ailton Krenak, em que ele diz que neblina, para os povos originários, tem sentido de cura. “Até o fim, ela observou em quais sentidos os trabalhos podiam tocar”, diz Marcelo. Diretor artístico do instituto e curador convidado da mostra, Jocelino Pessoa afirma que, diante de orientações tão detalhadas, Brígida tem uma presença muito marcada na retrospectiva. Por isso, o nome “Pontuações”. “Os desejos e a poética dela estão na exibição. Em vários momentos, durante a montagem, conseguíamos dizer o que ela ia gostar ou não”, comenta ele, adiantando que há outras duas exposições da carioca agendadas para os próximos dois anos. Um horizonte animador para Tiago, firme no propósito de levar adiante o legado da mãe. A tal história de doar o acervo para um museu, avisa, nem passa pela cabeça. “Vou cuidar de tudo isso enquanto conseguir. Ela tinha muito zelo pelas obras e me transmitiu isso de alguma forma”, comenta o filho, que fez questão de manter no quadro do instituto Ygor Landarin, assistente de Brígida desde 2017. “Ela sempre trabalhou mantendo a positividade e a paixão pelo que fazia. Foi uma lição muito importante.”
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