Deportação em massa de imigrantes nos EUA pode favorecer cartéis e afetar economia do México
Metade dos imigrantes irregulares vivendo nos EUA são mexicanos; com economia em retração e crime organizado dominando diversos territórios, país terá dificuldade de absorver expatriados Nenhum país será mais afetado do que o México pela promessa do presidente eleito dos EUA, Donald Trump, de promover “a maior deportação da História do país”. Dos 11 milhões de imigrantes em situação irregular nos Estados Unidos, quase metade é mexicana, liderando o ranking de nacionalidades com mais imigrantes indocumentados em solo americano, segundo dados do Departamento de Estado. Entenda: Quais obstáculos Trump terá de superar para cumprir plano de deportação em massa nos EUA? 'Não dá para sair à noite': Imigrantes brasileiros temem deportação em massa sob governo Trump Os primeiros anúncios feitos por Trump esta semana sobre os nomes que irão compor seu Gabinete indicam que o governo adotará a linha dura na agenda migratória, como ocorreu no primeiro mandato do republicano — que incluiu medidas controversas, como a separação de pais e filhos que cruzavam a fronteira e a construção de um muro entre EUA e México, embora tenha ocorrido de forma parcial e em termos diferentes do anunciado durante a sua campanha em 2016. Deportar os cerca de 5 milhões de mexicanos que vivem hoje em situação irregular nos EUA é mais fácil e mais barato do que fazer isso com países mais distantes — e hostis — dos EUA, como Venezuela e Cuba. Mas o vizinho latino-americano não está nenhum pouco pronto para isso. Sob nova direção, com a presidente Claudia Sheinbaum recém-empossada em outubro, o México pode ter pela frente o desafio de absorver milhões de migrantes desempregados em meio à desaceleração da economia e ao domínio crescente do crime organizado. Enquanto Trump anuncia o ex-diretor da agência de Imigração e Fiscalização Aduaneira (ICE, na sigla em inglês), Tom Harman, como seu "czar da fronteira", Sheinbaum ainda está montando sua equipe — e muitos cargos importantes na área de assistência social e migração estão vagos. Em entrevista após vitória: Trump diz que ‘não há preço alto demais’ para seu plano de deportação em massa nos EUA Hoje, cerca de 500 mexicanos são deportados dos EUA e enviados de volta à Cidade do México por semana. Lá, eles são acolhidos por funcionários do governo, que auxiliam na busca por emprego e obtenção de benefícios sociais. Outros são deportados pela fronteira terrestre mesmo, em áreas remotas onde não há infraestrutura suficiente para acolher a quantidade de imigrantes retornando — apesar de existir uma pequena rede de abrigos, a maioria administrada por grupos religiosos. Efeito econômico O primeiro impacto será econômico. Além da ameaça de deportação em massa, Trump — com sua característica política protecionista — prometeu impor tarifas aos produtos vindos do México, que hoje exportam 80% da sua produção para os EUA. Caso o fluxo de migrantes e tráfico de drogas pela fronteira não diminua drasticamente, o magnata disse que vai impor 25% de taxa sob produtos mexicanos, o que pode pressionar Sheinbaum a ceder como seu antecessor, Andrés Manuel López Obrador, fez durante o primeiro mandato do republicano. Por outro lado, como o país está com a taxa de desemprego baixa, o aumento no número de trabalhadores deve ter um efeito temporário na oferta de emprego. O problema maior, no entanto, é que os migrantes irregulares que viviam nos EUA, embora muitos ocupassem postos de menor remuneração por lá, se verão diante de um novo tipo de pobreza, com uma moeda muito menos valorizada que o dólar. Migrantes são vistos de Juarez, México, ao longo da costa do Rio Grande, abaixo do muro fronteiriço no lado dos EUA da fronteira. Paul Ratje/The New York Times Há, ainda, a questão das remessas enviadas pelos expatriados ao país. No ano passado, mexicanos enviaram US$ 60 bilhões ao país, grande parte para ajudar familiares. Ao Post, Tyler Mattiace, pesquisador da ONG Human Rights Watch para as Américas, disse que as deportações em larga escala “podem afetar seriamente as pessoas mais pobres” por isso. A economia dos EUA também sofreria impacto, já que imigrantes irregulares preenchem postos em setores como construção civil, hotelaria e agricultura, evitados por muitos americanos. Initial plugin text Oportunidade para o crime Além disso, a deportação em massa também abriria uma janela de oportunidade para os cartéis mexicanos. Segundo Homan, recém-nomeado para comandar a fronteira, o governo inicialmente dedicará seus esforços aos imigrantes que foram fichados criminalmente ou que violaram ordens de deportação emitidas por juízes. Mas as rígidas políticas migratórias impostas por Trump no primeiro mandato tiveram um efeito reverso no combate ao crime organizado. Em 2019, quando o republicano introduziu a medida “Permaneça no México”, forçando solicitantes de asilo a aguardar pelas audiências com juízes de imigração no país, milhares deles foram sequestrados por organizações criminosas que atuam em cidades fron
Metade dos imigrantes irregulares vivendo nos EUA são mexicanos; com economia em retração e crime organizado dominando diversos territórios, país terá dificuldade de absorver expatriados Nenhum país será mais afetado do que o México pela promessa do presidente eleito dos EUA, Donald Trump, de promover “a maior deportação da História do país”. Dos 11 milhões de imigrantes em situação irregular nos Estados Unidos, quase metade é mexicana, liderando o ranking de nacionalidades com mais imigrantes indocumentados em solo americano, segundo dados do Departamento de Estado. Entenda: Quais obstáculos Trump terá de superar para cumprir plano de deportação em massa nos EUA? 'Não dá para sair à noite': Imigrantes brasileiros temem deportação em massa sob governo Trump Os primeiros anúncios feitos por Trump esta semana sobre os nomes que irão compor seu Gabinete indicam que o governo adotará a linha dura na agenda migratória, como ocorreu no primeiro mandato do republicano — que incluiu medidas controversas, como a separação de pais e filhos que cruzavam a fronteira e a construção de um muro entre EUA e México, embora tenha ocorrido de forma parcial e em termos diferentes do anunciado durante a sua campanha em 2016. Deportar os cerca de 5 milhões de mexicanos que vivem hoje em situação irregular nos EUA é mais fácil e mais barato do que fazer isso com países mais distantes — e hostis — dos EUA, como Venezuela e Cuba. Mas o vizinho latino-americano não está nenhum pouco pronto para isso. Sob nova direção, com a presidente Claudia Sheinbaum recém-empossada em outubro, o México pode ter pela frente o desafio de absorver milhões de migrantes desempregados em meio à desaceleração da economia e ao domínio crescente do crime organizado. Enquanto Trump anuncia o ex-diretor da agência de Imigração e Fiscalização Aduaneira (ICE, na sigla em inglês), Tom Harman, como seu "czar da fronteira", Sheinbaum ainda está montando sua equipe — e muitos cargos importantes na área de assistência social e migração estão vagos. Em entrevista após vitória: Trump diz que ‘não há preço alto demais’ para seu plano de deportação em massa nos EUA Hoje, cerca de 500 mexicanos são deportados dos EUA e enviados de volta à Cidade do México por semana. Lá, eles são acolhidos por funcionários do governo, que auxiliam na busca por emprego e obtenção de benefícios sociais. Outros são deportados pela fronteira terrestre mesmo, em áreas remotas onde não há infraestrutura suficiente para acolher a quantidade de imigrantes retornando — apesar de existir uma pequena rede de abrigos, a maioria administrada por grupos religiosos. Efeito econômico O primeiro impacto será econômico. Além da ameaça de deportação em massa, Trump — com sua característica política protecionista — prometeu impor tarifas aos produtos vindos do México, que hoje exportam 80% da sua produção para os EUA. Caso o fluxo de migrantes e tráfico de drogas pela fronteira não diminua drasticamente, o magnata disse que vai impor 25% de taxa sob produtos mexicanos, o que pode pressionar Sheinbaum a ceder como seu antecessor, Andrés Manuel López Obrador, fez durante o primeiro mandato do republicano. Por outro lado, como o país está com a taxa de desemprego baixa, o aumento no número de trabalhadores deve ter um efeito temporário na oferta de emprego. O problema maior, no entanto, é que os migrantes irregulares que viviam nos EUA, embora muitos ocupassem postos de menor remuneração por lá, se verão diante de um novo tipo de pobreza, com uma moeda muito menos valorizada que o dólar. Migrantes são vistos de Juarez, México, ao longo da costa do Rio Grande, abaixo do muro fronteiriço no lado dos EUA da fronteira. Paul Ratje/The New York Times Há, ainda, a questão das remessas enviadas pelos expatriados ao país. No ano passado, mexicanos enviaram US$ 60 bilhões ao país, grande parte para ajudar familiares. Ao Post, Tyler Mattiace, pesquisador da ONG Human Rights Watch para as Américas, disse que as deportações em larga escala “podem afetar seriamente as pessoas mais pobres” por isso. A economia dos EUA também sofreria impacto, já que imigrantes irregulares preenchem postos em setores como construção civil, hotelaria e agricultura, evitados por muitos americanos. Initial plugin text Oportunidade para o crime Além disso, a deportação em massa também abriria uma janela de oportunidade para os cartéis mexicanos. Segundo Homan, recém-nomeado para comandar a fronteira, o governo inicialmente dedicará seus esforços aos imigrantes que foram fichados criminalmente ou que violaram ordens de deportação emitidas por juízes. Mas as rígidas políticas migratórias impostas por Trump no primeiro mandato tiveram um efeito reverso no combate ao crime organizado. Em 2019, quando o republicano introduziu a medida “Permaneça no México”, forçando solicitantes de asilo a aguardar pelas audiências com juízes de imigração no país, milhares deles foram sequestrados por organizações criminosas que atuam em cidades fronteiriças, que pediam resgate aos seus familiares. Hoje, parte do lucro bilionário dos cartéis inclui a "taxação" dos coiotes contratados pelos migrantes para fazer a travessia — que muitas vezes começa bem antes do México. Além disso, o aumento da desigualdade social com a chegada de mais mexicanos em situação de vulnerabilidade no país pode jogar parte deles no colo do crime organizado. Deportação em massa x boas relações com México: imigração dominará agenda de Trump e Kamala Para Marvin Ajic, padre que administrou por quatro anos um abrigo para migrantes, um endurecimento da política pode piorar a situação para os migrantes. — Os cartéis praticamente declararam o controle da região norte [do México] — disse ele. — Os migrantes ficarão mais vulneráveis. No ano passado, pressionado pelo governo do presidente Joe Biden, o México instituiu suas próprias medidas para reprimir a migração, o que ajudou a reduzir em 78% o número de apreensões na fronteira desde dezembro, quando os EUA registrarão recorde histórico de travessias. Com isso, o número de cruzamentos hoje está menor do que quando Trump deixou a Casa Branca. Questionada sobre a nomeação de Homan, Sheinbaum disse na segunda-feira que “sempre defenderemos os mexicanos do outro lado da fronteira”. Ela disse que reforçará o quadro de funcionários dos mais de 50 consulados mexicanos nos Estados Unidos para ajudar a garantir que os direitos dos migrantes sejam respeitados.
Qual é a sua reação?