'Tour da propina': uma hora depois de extorquir dinheiro de comerciante, PMs deixaram de atender ocorrência

Ao todo, 21 agentes do 20º BPM (Mesquita) foram presos em ação conjunta da Corregedoria e do Ministério Público Enquanto as tropas de elite da Polícia Militar faziam na manhã desta quinta-feira uma apresentação de como está treinando para garantir a segurança de líderes mundias durante a Cúpula do G20, equipes da corregedoria da corporação estavam nas ruas para prender 21 agentes acusados de extorquir dinheiro — e até mesmo cerveja — de 54 comerciantes em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. A denúncia do Ministério Público do Rio contra 22 PMs — só um deles não foi preso — mostra que eles deixaram até mesmo de atender a uma ocorrência, passada pelo rádio da patrulha, para cumprir o “tour da propina”. 'Tour da propina': Corregedoria da PM faz operação para prender 22 policiais militares por extorsão 'Não tem como olhar dez mil policiais': agente preso por 'tour da propina' ironiza fiscalização de câmera corporal Quatro soldados, seis cabos, 11 sargentos e um subtenente foram denunciados e alvos da operação Segreto, deflagrada ontem. Teve policial sendo preso de farda dentro de batalhão. Todos foram levados para a sede da Corregedoria da PM, em São Cristóvão, na Zona Norte. O único policial que não foi preso alegou estar viajando de férias, informou o “RJ2”, da TV Globo. A Justiça também foi determinou a busca e apreensão nas casas dos agentes, assim como em carros usados pelos denunciados, incluindo viaturas, assim como os armários usados por eles nos batalhões. A denúncia dos promotores Paulo Roberto Mello Cunha Júnior e Allana Alves Costa Poubel, aponta que os policiais Wallace da Silva Oliveira, Felipe Menezes Junqueira França e João Carlos Oliveira de Brito haviam ido às 9h37 a um centro de reciclagem clandestino no bairro Vila Abolição, em Nova iguaçu, recolher “vantagem indevida” em dinheiro. Às 11h, no entanto, optaram por não atender o chamado para uma ocorrência. Preparação para o G20: tropa especial da Polícia Militar faz exercício simulado antiterrorismo Modus Operandi Os militares foram denunciados por corrupção passiva, negativa de obediência e associação criminosa. Segundo a denúncia, foi identificado o recolhimento de valores em 54 estabelecimentos, todos em Nova Iguaçu, área de atuação do 20º BPM (Mesquita). A unidade era onde todos estavam lotados na época dos crimes, que aconteceram no segundo semestre de 2023. Como os envolvidos tinham um dia certo para fazer a cobrança das taxas — sempre às sextas-feiras —, o grupo foi batizado pela investigação como "tour da propina". O MPRJ destacou que esse tipo de ação dos envolvidos transformou o serviço na PM "numa verdadeira caçada ao 'arrego'". De acordo com a denúncia, “todas as guarnições identificadas agiram da mesma forma, ou seja, uma espécie de ‘roteiro de visitas’ em estabelecimentos comerciais, dos tipos centros de reciclagem/ferro-velho, lojas de materiais de construção, depósitos de gás e outros, onde arrecadam valores, produto de corrupção passiva”. Nem mesmo depósitos de bebidas e vendedores de fruta escapavam dos policiais. Um dos policiais presos em operação da Corregedoria da Polícia Militar do Rio contra grupo investigado por extorsão e ameaças em Nova Iguaçu Fabiano Rocha / Agência O Globo Complexo de Israel: Policiais penais de MG entram por engano em comunidade do Rio e são alvejados por bandidos; houve troca de tiros Para cometer os delitos, no entanto, os agentes burlavam as câmeras corporais (COPs), obrigatórias durante o serviço. A investigação apontou que muitos deles sequer pegavam o equipamento no início do dia de trabalho, o que também começou a despertar suspeitas sobre o grupo. — A não utilização da câmera, segundo a Corregedoria, é considerada falta grave. O policial pode ser punido e até excluído. Por conta disso, esses policiais faziam tentativas de burlar essa câmera, ou tentar ocultar e esconder, ou até mesmo não pegar a câmera durante o serviço, o que já caracteriza uma falta grave — afirmou a tenente-coronel Cláudia Moraes, porta-voz da PM. Mas esse tipo de ação era até ironizada pelos policiais. Um deles chegou a dizer, conforme áudio capturado pelo Ministério Público, que o dia em que fosse cometer um crime, não estaria usando a COP. Depois de uma pausa, ele foi além: "Esse negócio aí, que ficam olhando lá no monitor olham por amostragem pô, não tem como olhar cinquenta mil (policiais), vamo bota vinte mil ‘polícia’, dez mil, não tem como olhar", afirmou. A ação, relata o MPRJ, ocorria em “evidente prejuízo à segurança pública da população”. 'Este corpo tem de aparecer', diz avô de bebê que teve restos mortais levados de sepultura em cemitério no RJ Além das COPs burladas, os agentes também acionavam a sirene rapidamente na chegada aos locais de extorsão, como sinal de que haviam chegado para pegar o dinheiro. Os agentes do 20º BPM foram capazes até de abandonar uma “viatura aberta, em plena via pública, com armamento em seu interior” enquanto entravam em um ponto de reciclagem para pegar valores indevido

Nov 8, 2024 - 03:01
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'Tour da propina': uma hora depois de extorquir dinheiro de comerciante, PMs deixaram de atender ocorrência

Ao todo, 21 agentes do 20º BPM (Mesquita) foram presos em ação conjunta da Corregedoria e do Ministério Público Enquanto as tropas de elite da Polícia Militar faziam na manhã desta quinta-feira uma apresentação de como está treinando para garantir a segurança de líderes mundias durante a Cúpula do G20, equipes da corregedoria da corporação estavam nas ruas para prender 21 agentes acusados de extorquir dinheiro — e até mesmo cerveja — de 54 comerciantes em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. A denúncia do Ministério Público do Rio contra 22 PMs — só um deles não foi preso — mostra que eles deixaram até mesmo de atender a uma ocorrência, passada pelo rádio da patrulha, para cumprir o “tour da propina”. 'Tour da propina': Corregedoria da PM faz operação para prender 22 policiais militares por extorsão 'Não tem como olhar dez mil policiais': agente preso por 'tour da propina' ironiza fiscalização de câmera corporal Quatro soldados, seis cabos, 11 sargentos e um subtenente foram denunciados e alvos da operação Segreto, deflagrada ontem. Teve policial sendo preso de farda dentro de batalhão. Todos foram levados para a sede da Corregedoria da PM, em São Cristóvão, na Zona Norte. O único policial que não foi preso alegou estar viajando de férias, informou o “RJ2”, da TV Globo. A Justiça também foi determinou a busca e apreensão nas casas dos agentes, assim como em carros usados pelos denunciados, incluindo viaturas, assim como os armários usados por eles nos batalhões. A denúncia dos promotores Paulo Roberto Mello Cunha Júnior e Allana Alves Costa Poubel, aponta que os policiais Wallace da Silva Oliveira, Felipe Menezes Junqueira França e João Carlos Oliveira de Brito haviam ido às 9h37 a um centro de reciclagem clandestino no bairro Vila Abolição, em Nova iguaçu, recolher “vantagem indevida” em dinheiro. Às 11h, no entanto, optaram por não atender o chamado para uma ocorrência. Preparação para o G20: tropa especial da Polícia Militar faz exercício simulado antiterrorismo Modus Operandi Os militares foram denunciados por corrupção passiva, negativa de obediência e associação criminosa. Segundo a denúncia, foi identificado o recolhimento de valores em 54 estabelecimentos, todos em Nova Iguaçu, área de atuação do 20º BPM (Mesquita). A unidade era onde todos estavam lotados na época dos crimes, que aconteceram no segundo semestre de 2023. Como os envolvidos tinham um dia certo para fazer a cobrança das taxas — sempre às sextas-feiras —, o grupo foi batizado pela investigação como "tour da propina". O MPRJ destacou que esse tipo de ação dos envolvidos transformou o serviço na PM "numa verdadeira caçada ao 'arrego'". De acordo com a denúncia, “todas as guarnições identificadas agiram da mesma forma, ou seja, uma espécie de ‘roteiro de visitas’ em estabelecimentos comerciais, dos tipos centros de reciclagem/ferro-velho, lojas de materiais de construção, depósitos de gás e outros, onde arrecadam valores, produto de corrupção passiva”. Nem mesmo depósitos de bebidas e vendedores de fruta escapavam dos policiais. Um dos policiais presos em operação da Corregedoria da Polícia Militar do Rio contra grupo investigado por extorsão e ameaças em Nova Iguaçu Fabiano Rocha / Agência O Globo Complexo de Israel: Policiais penais de MG entram por engano em comunidade do Rio e são alvejados por bandidos; houve troca de tiros Para cometer os delitos, no entanto, os agentes burlavam as câmeras corporais (COPs), obrigatórias durante o serviço. A investigação apontou que muitos deles sequer pegavam o equipamento no início do dia de trabalho, o que também começou a despertar suspeitas sobre o grupo. — A não utilização da câmera, segundo a Corregedoria, é considerada falta grave. O policial pode ser punido e até excluído. Por conta disso, esses policiais faziam tentativas de burlar essa câmera, ou tentar ocultar e esconder, ou até mesmo não pegar a câmera durante o serviço, o que já caracteriza uma falta grave — afirmou a tenente-coronel Cláudia Moraes, porta-voz da PM. Mas esse tipo de ação era até ironizada pelos policiais. Um deles chegou a dizer, conforme áudio capturado pelo Ministério Público, que o dia em que fosse cometer um crime, não estaria usando a COP. Depois de uma pausa, ele foi além: "Esse negócio aí, que ficam olhando lá no monitor olham por amostragem pô, não tem como olhar cinquenta mil (policiais), vamo bota vinte mil ‘polícia’, dez mil, não tem como olhar", afirmou. A ação, relata o MPRJ, ocorria em “evidente prejuízo à segurança pública da população”. 'Este corpo tem de aparecer', diz avô de bebê que teve restos mortais levados de sepultura em cemitério no RJ Além das COPs burladas, os agentes também acionavam a sirene rapidamente na chegada aos locais de extorsão, como sinal de que haviam chegado para pegar o dinheiro. Os agentes do 20º BPM foram capazes até de abandonar uma “viatura aberta, em plena via pública, com armamento em seu interior” enquanto entravam em um ponto de reciclagem para pegar valores indevidos. Nem mesmo uma criança foi poupada pelos agentes que buscavam o “arrego”. Em 22 de setembro do ano passado, no bairro Vila de Cava, agentes abordaram um menino. “Qual é menor, teu pai tá aí, não? Tá aí ele?”, disse um agente na ocasião. Mais que dinheiro Os locais extorquidos pelo grupo cediam em algumas ocasiões mais do que dinheiro em espécie. Os agentes recolhiam frutas em um hortifruti, assim como cerveja para um churrasco num depósito de bebidas. Os policiais, em determinada ocasião, ainda escolheram a marca da cerveja que iriam levar consigo, afirmando que de um rótulo específico “ninguém gosta”. A extorsão era tamanha que policiais chegavam a disputar áreas com companheiros de batalhão. Em 20 de outubro de 2023, policiais haviam deixado uma loja de materiais de construção rumo a um centro de reciclagem clandestino, quando avistaram uma outra viatura no local. Depois de soltar um palavrão, o cabo Tiago de Almeida Pessoa afirmou: “chegaram primeiro”. Os diálogos reproduzidos pelo MPRJ “demonstram que a prática generalizada de arrecadação propina não só era habitual, como chegava mesmo a confundir os que cediam os valores monetários a título (de) vantagem indevida e estabelecia, em várias ocasiões, verdadeira corrida entre as guarnições”, observa o texto dos promotores. Além da denúncia do MPRJ, um Inquérito Policial Militar foi instaurado para apurar o caso. A investigação nasceu de uma denúncia de um comerciante à Corregedoria, que instalou câmeras em seu estabelecimento e relatou tudo à polícia, mostrando como os policiais agiam, inclusive enviando imagens da viatura em sua porta, recebendo os valores.

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