Exposição em Madri destaca a Marvel desde sua origem até a consolidação como um totem cultural
Em cartaz na capital espanhola, a mostra 'Marvel: Universo de super-heróis' reúne roteiros e artes originais de HQs, figurinos de filmes e espaços interativos A Marvel mudou tudo no mundo dos quadrinhos, embora ele também tenha deixado alguns corpos ao longo do caminho. Quando Stan Lee criou a linha de super-heróis na editora nos anos 1960, desenvolveu um sistema de trabalho que lhe deu espaço para publicar dezenas de quadrinhos por mês sob sua assinatura. Em um processo em que ele escrevia um esboço de roteiro, depois ilustrado detalhadamente por desenhistas e estruturado em quadrinhos para, em seguida, voltarem às suas mãos para escrever o texto dos balões de fala, Lee criou centenas de ideias e personagens em apenas quatro anos, dos quais muitos ainda sobrevivem. Mas o processo também serviu para forjar uma inimizade eterna entre os seus co-criadores. À medida que as obras se acumulavam e o sucesso crescia, os roteiros de Lee tornaram-se uma frase única e muito descritiva que artistas como Jack Kirby (com quem criou O Quarteto Fantástico e Os Vingadores) ou Steve Ditko (em Homem-Aranha ou Doutor Estranho) teriam que desenvolver ao longo de uma história em quadrinhos de 22 páginas. Logo reivindicaram a autoria e, antes do final da década, deixaram os escritórios. Os debates sobre o que cada um fez se estendem até os dias de hoje , quando seus personagens são totens e deuses lucrativos para as massas. Tal como alguém na Grécia antiga que entrava nos templos para adorar Zeus ou Atenas, hoje os visitantes podem entrar nos corredores mal iluminados de um pavilhão da Ifema, em Madrid, para posar com uma estátua do Homem-Aranha pendurada no teto ou com a Feiticeira Escarlate atrás de um púlpito. A partir de uma sala que simula um estúdio de desenho clássico, a exposição "Marvel: Universo de super-heróis" relembra o fenômeno e, por meio de explicações como como uma história em quadrinhos da Marvel foi criada em seus primórdios, tenta desvendar este sucesso, que hoje ultrapassa US$ 40 bilhões em ingressos vendidos e mais de 60 filmes lançados nos cinemas. Além de estar impresso em canecas, brinquedos, hotéis , roupas... — Nenhum desses personagens nasceu do nada. Eles foram criados por pessoas. E há centenas de pessoas trabalhando em cada filme. Queríamos reconhecer o trabalho de todos e como essa criação individual cria um universo tão massivo — afirma o curador Patrick A. Reed, especialista editorial que levou a exposição a Madri após passagem pelos Estados Unidos e Suíça. Itens de merchandising na mostra David Tembleque (Marvel) Foram necessários 20 caminhões para montar a logística. Neles vieram originais como os primeiros "Marvel Comics" ou "Amazing Fantasy" 15 , a primeira aparição do Homem-Aranha em 1962 (uma história em quadrinhos que foi vendida em 2021 por US$ 3,6 milhões); ilustrações de "Demolidor", de Frank Miller, e "Trilha Prateada", de Moebius; um roteiro datilografado por Stan Lee, ou o pôster banido das Torres Gêmeas do primeiro filme do Homem-Aranha. Os organizadores vistaram casas de colecionadores para juntar todo o material. Mas a armadura original do filme "Homem de Ferro" ou o traje do Wolverine em cujo tecido você pode ver os buracos de bala também viajavam em caixas. Vem direto do recente "Deadpool e Wolverine" e é um dos novos itens nesta exposição em constante evolução. Todos os objetos são expostos acompanhados de textos explicativos que ajudam a conectar os pontos da criação de cada personagem, mas sem esquecer as estátuas prontas para a foto de veneração no Instagram. — Queríamos que a exposição fosse apreciada a vários níveis. As crianças podem tirar foto com o Homem-Aranha e os adultos podem ler as explicações — explica Reed, que construiu a exposição sobre três pontos: a história dos quadrinhos, a explicação de quem é cada super-herói e a relevância da marca na cultura de massa. O visitante pode passar 20 minutos apenas olhando os figurinos dos filmes ou várias horas entendendo o contexto. E, se gosta de jogos, pode experimentar os telas touch screen ou os espaços interativos (obrigatórios agora em qualquer exposição) como um voo vestido de Homem de Ferro ou as clássicas máquinas de pinball. Tramas fantásticas com pé na realidade E por que a Marvel continua a ter sucesso a este nível e com um público tão heterogêneo? Reed relembra o slogan clássico da empresa, "O mundo que você vê pela sua janela", que defendia a realidade de seus cenários e situações. Ou seja, em seus quadrinhos havia tramas de amor nas ruas reais de Nova York. Esse olhar sobre o que estava acontecendo no mundo foi o que fez a Marvel apresentar um personagem como Pantera Negra no meio da luta pelos direitos civis ou mostrar os mutantes como "perseguidos e odiados" como metáforas das diferenças de pensamento de líderes como Malcolm X (que seria Magneto) e Martin Luther King (Professor Xavier). Uma reflexão social que também, como explica a exposição, fez com que a editora rompesse definitivamente com a
Em cartaz na capital espanhola, a mostra 'Marvel: Universo de super-heróis' reúne roteiros e artes originais de HQs, figurinos de filmes e espaços interativos A Marvel mudou tudo no mundo dos quadrinhos, embora ele também tenha deixado alguns corpos ao longo do caminho. Quando Stan Lee criou a linha de super-heróis na editora nos anos 1960, desenvolveu um sistema de trabalho que lhe deu espaço para publicar dezenas de quadrinhos por mês sob sua assinatura. Em um processo em que ele escrevia um esboço de roteiro, depois ilustrado detalhadamente por desenhistas e estruturado em quadrinhos para, em seguida, voltarem às suas mãos para escrever o texto dos balões de fala, Lee criou centenas de ideias e personagens em apenas quatro anos, dos quais muitos ainda sobrevivem. Mas o processo também serviu para forjar uma inimizade eterna entre os seus co-criadores. À medida que as obras se acumulavam e o sucesso crescia, os roteiros de Lee tornaram-se uma frase única e muito descritiva que artistas como Jack Kirby (com quem criou O Quarteto Fantástico e Os Vingadores) ou Steve Ditko (em Homem-Aranha ou Doutor Estranho) teriam que desenvolver ao longo de uma história em quadrinhos de 22 páginas. Logo reivindicaram a autoria e, antes do final da década, deixaram os escritórios. Os debates sobre o que cada um fez se estendem até os dias de hoje , quando seus personagens são totens e deuses lucrativos para as massas. Tal como alguém na Grécia antiga que entrava nos templos para adorar Zeus ou Atenas, hoje os visitantes podem entrar nos corredores mal iluminados de um pavilhão da Ifema, em Madrid, para posar com uma estátua do Homem-Aranha pendurada no teto ou com a Feiticeira Escarlate atrás de um púlpito. A partir de uma sala que simula um estúdio de desenho clássico, a exposição "Marvel: Universo de super-heróis" relembra o fenômeno e, por meio de explicações como como uma história em quadrinhos da Marvel foi criada em seus primórdios, tenta desvendar este sucesso, que hoje ultrapassa US$ 40 bilhões em ingressos vendidos e mais de 60 filmes lançados nos cinemas. Além de estar impresso em canecas, brinquedos, hotéis , roupas... — Nenhum desses personagens nasceu do nada. Eles foram criados por pessoas. E há centenas de pessoas trabalhando em cada filme. Queríamos reconhecer o trabalho de todos e como essa criação individual cria um universo tão massivo — afirma o curador Patrick A. Reed, especialista editorial que levou a exposição a Madri após passagem pelos Estados Unidos e Suíça. Itens de merchandising na mostra David Tembleque (Marvel) Foram necessários 20 caminhões para montar a logística. Neles vieram originais como os primeiros "Marvel Comics" ou "Amazing Fantasy" 15 , a primeira aparição do Homem-Aranha em 1962 (uma história em quadrinhos que foi vendida em 2021 por US$ 3,6 milhões); ilustrações de "Demolidor", de Frank Miller, e "Trilha Prateada", de Moebius; um roteiro datilografado por Stan Lee, ou o pôster banido das Torres Gêmeas do primeiro filme do Homem-Aranha. Os organizadores vistaram casas de colecionadores para juntar todo o material. Mas a armadura original do filme "Homem de Ferro" ou o traje do Wolverine em cujo tecido você pode ver os buracos de bala também viajavam em caixas. Vem direto do recente "Deadpool e Wolverine" e é um dos novos itens nesta exposição em constante evolução. Todos os objetos são expostos acompanhados de textos explicativos que ajudam a conectar os pontos da criação de cada personagem, mas sem esquecer as estátuas prontas para a foto de veneração no Instagram. — Queríamos que a exposição fosse apreciada a vários níveis. As crianças podem tirar foto com o Homem-Aranha e os adultos podem ler as explicações — explica Reed, que construiu a exposição sobre três pontos: a história dos quadrinhos, a explicação de quem é cada super-herói e a relevância da marca na cultura de massa. O visitante pode passar 20 minutos apenas olhando os figurinos dos filmes ou várias horas entendendo o contexto. E, se gosta de jogos, pode experimentar os telas touch screen ou os espaços interativos (obrigatórios agora em qualquer exposição) como um voo vestido de Homem de Ferro ou as clássicas máquinas de pinball. Tramas fantásticas com pé na realidade E por que a Marvel continua a ter sucesso a este nível e com um público tão heterogêneo? Reed relembra o slogan clássico da empresa, "O mundo que você vê pela sua janela", que defendia a realidade de seus cenários e situações. Ou seja, em seus quadrinhos havia tramas de amor nas ruas reais de Nova York. Esse olhar sobre o que estava acontecendo no mundo foi o que fez a Marvel apresentar um personagem como Pantera Negra no meio da luta pelos direitos civis ou mostrar os mutantes como "perseguidos e odiados" como metáforas das diferenças de pensamento de líderes como Malcolm X (que seria Magneto) e Martin Luther King (Professor Xavier). Uma reflexão social que também, como explica a exposição, fez com que a editora rompesse definitivamente com a censura do antigo selo do código de conduta dos quadrinhos, o famigerado Comic Code. Página original da edição n°1 'Marvel Comics', com o Tocha Humana David Tembleque (Marvel) O selo, que determinava que "em todos os casos o bem triunfará sobre o mal" ou que "o respeito pelos pais será incentivado", desapareceu de suas capas quando Stan Lee decidiu contar a história do vício em drogas e a abstinência do amigo de Peter Parker, Harry Osborn. Os quadrinhos foram ainda mais longe quando, em pleno Watergate, o Capitão América enfrentou o Império Secreto , liderado nas sombras por um presidente dos EUA que buscava o poder absoluto. No ano que vem um filme do personagem (hoje um herói afro-americano vivido por Anthony Mackie ) mostrará como o atual presidente, interpretado por Harrison Ford, se transforma em um monstro, o Hulk Vermelho. — Eles se propuseram a fazer quadrinhos com diversidade porque moravam em Nova York e viam pessoas de todos os tipos no metrô, de todas as cores e gêneros. Eles criaram um mundo que se parecia com o seu — lembra Reed, que a partir dessa humanidade também tenta explicar o confronto de seus criadores: — Em qualquer colaboração criativa, como com John Lennon e Paul McCartney, você tem aquela tensão que ajuda a elevar o material . São pessoas diferentes, com perspectivas próprias sobre o trabalho, e isso deu mais camadas, mais profundidade e detalhes. A criação é fluida, pois também são personagens que se desenvolvem há décadas, trocando de mãos e mudando de design, nome, história. O Wolverine que conhecemos combina o de centenas de criadores, e cada um o fez evoluir.
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