Com agendas divergentes, Milei e Macron se reúnem na Casa Rosada antes do G20

Nos bastidores, Macron tenta 'conectar' argentino às prioridades do grupo; ultraliberal quer retirar Argentina de acordos climáticos e tem causado alvoroço nos bastidores da cúpula Seis anos depois, o presidente francês, Emmanuel Macron, retornou neste domingo à Casa Rosada. Foi recebido pelo presidente argentino, o ultraliberal Javier Milei, que o acompanhou do Salão dos Bustos até seu Gabinete, depois de passar pelo Salão Branco de Balcarce 50 para a saudação formal. A visita ocorre antes da viagem de ambos ao Brasil para a cúpula do G20 e, de acordo com fontes do Palácio do Eliseu, sede da Presidência francesa, tem o objetivo declarado de "conectar o presidente Milei com as prioridades do G20". Bastidores do G20: Argentina tenta impedir menção à proposta de taxação aos super-ricos em declaração de presidentes Antes do G20: Brasil teme que Milei vire dor de cabeça na cúpula do G20 e, depois de encontro com Trump, faça acenos a Bolsonaro Milei, cético em relação ao aquecimento global, retirou na quarta-feira a delegação de seu país da 29ª conferência sobre mudanças climáticas da ONU (COP29) em Baku e especula-se sobre sua possível saída do Acordo Climático de Paris, algo que o presidente Donald Trump fez durante seu primeiro mandato (2017-2021) e promete fazer novamente ao retornar à Casa Branca. Nos bastidores, o presidente argentino também parece estar causando um rebuliço ao mudar posicionamentos já acordados e corre o risco de ficar fora do documento, segundo fontes oficiais ao GLOBO. Na quinta-feira, os negociadores argentinos informaram aos demais países que receberam "novas instruções" da Casa Rosada e passaram a se opor à inclusão no texto da proposta de taxação dos super-ricos, uma das consideradas mais importantes pelo Brasil. Nesse contexto, Macron espera "superar" as "diferenças", especialmente sobre o meio ambiente, a fim de “convencer a Argentina a aderir ao consenso internacional (...) e às prioridades do G20”, de acordo com fontes do Eliseu no sábado. "Vamos falar sobre nossos interesses comerciais, nosso comércio, a defesa de nossa agricultura e de nossos agricultores", disse o chefe de Estado francês no TikTok, do avião que o levava a Buenos Aires. Economia para evitar atritos Para contornar os pontos de divergências, o governo francês optou por dar ênfase às coincidências na área da comércio. Os investimentos franceses na Argentina são, para o governo, o principal motivo de interesse na reunião bilateral, incluindo na área de metais críticos, já que o grupo de mineração Eramet acaba de inaugurar uma mina de lítio no país sul-americano. De acordo com fontes oficiais, os recentes anúncios de investimentos de grupos franceses no país, como a rede de supermercados Carrefour e a empresa automobilística Renault, também farão parte das conversas. Entrevista: 'Consenso no G20 criaria tabuleiro diferente para futuro com Trump', diz Tatiana Rosito, coordenadora da trilha de finanças Macron também deve tentar avançar na possível venda dos submarinos franceses Scorpène, embora a presidência francesa esteja minimizando o status das negociações. O presidente também se tornará um porta-voz da rejeição de fazendeiros e políticos quanto a um possível acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul, que inclui a Argentina. Eles temem que o acordo aumente a disponibilidade de carne latino-americana no continente e e traga a concorrência desleal de produtos que não estão sujeitos aos rígidos padrões ambientais e de saúde em vigor na Europa. Macron também deverá abordar o assunto no Rio, principalmente com os outros europeus, em particular a Alemanha e a Espanha, a quem ele deve convencer a não ignorar a oposição francesa. Além de reafirmar as boas relações entre os presidentes, que se encontraram em julho passado em Paris durante a inauguração dos Jogos Olímpicos, a agenda de Macron inclui outras questões, como a preocupação com as mudanças climáticas, algo que a Argentina minimiza, e uma homenagem aos franceses desaparecidos durante a ditadura argentina (1976-1979), gesto que contrasta com a visão de Milei sobre o que aconteceu na Argentina durante a década de 1970. Macron e sua esposa, a primeira-dama Brigitte, depositaram uma coroa de flores ao pé da Igreja da Santa Cruz, um memorial da resistência. Em dezembro de 1977, 12 pessoas, entre elas várias fundadoras das Mães da Praça de Maio e as freiras francesas Léonie Duquet e Alice Domon, foram sequestradas, torturadas, assassinadas e jogadas ao mar após se reunirem no templo. Ao todo, quase 20 franceses desaparecidos e assassinados durante a ditadura. — Não os esqueceremos — disse Macron aos parentes das vítimas que conversaram com ele, contaram suas histórias e o agradeceram pela visita à igreja. O presidente Emmanuel Macron e o presidente Javier Milei de mãos dadas na sacada da Casa Rosada, após reunião em Buenos Aires JUAN MABROMATA/AFP A homenagem foi descrita por fontes próximas ao presidente francês como "emocionante" e contou

Nov 17, 2024 - 14:07
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Com agendas divergentes, Milei e Macron se reúnem na Casa Rosada antes do G20

Nos bastidores, Macron tenta 'conectar' argentino às prioridades do grupo; ultraliberal quer retirar Argentina de acordos climáticos e tem causado alvoroço nos bastidores da cúpula Seis anos depois, o presidente francês, Emmanuel Macron, retornou neste domingo à Casa Rosada. Foi recebido pelo presidente argentino, o ultraliberal Javier Milei, que o acompanhou do Salão dos Bustos até seu Gabinete, depois de passar pelo Salão Branco de Balcarce 50 para a saudação formal. A visita ocorre antes da viagem de ambos ao Brasil para a cúpula do G20 e, de acordo com fontes do Palácio do Eliseu, sede da Presidência francesa, tem o objetivo declarado de "conectar o presidente Milei com as prioridades do G20". Bastidores do G20: Argentina tenta impedir menção à proposta de taxação aos super-ricos em declaração de presidentes Antes do G20: Brasil teme que Milei vire dor de cabeça na cúpula do G20 e, depois de encontro com Trump, faça acenos a Bolsonaro Milei, cético em relação ao aquecimento global, retirou na quarta-feira a delegação de seu país da 29ª conferência sobre mudanças climáticas da ONU (COP29) em Baku e especula-se sobre sua possível saída do Acordo Climático de Paris, algo que o presidente Donald Trump fez durante seu primeiro mandato (2017-2021) e promete fazer novamente ao retornar à Casa Branca. Nos bastidores, o presidente argentino também parece estar causando um rebuliço ao mudar posicionamentos já acordados e corre o risco de ficar fora do documento, segundo fontes oficiais ao GLOBO. Na quinta-feira, os negociadores argentinos informaram aos demais países que receberam "novas instruções" da Casa Rosada e passaram a se opor à inclusão no texto da proposta de taxação dos super-ricos, uma das consideradas mais importantes pelo Brasil. Nesse contexto, Macron espera "superar" as "diferenças", especialmente sobre o meio ambiente, a fim de “convencer a Argentina a aderir ao consenso internacional (...) e às prioridades do G20”, de acordo com fontes do Eliseu no sábado. "Vamos falar sobre nossos interesses comerciais, nosso comércio, a defesa de nossa agricultura e de nossos agricultores", disse o chefe de Estado francês no TikTok, do avião que o levava a Buenos Aires. Economia para evitar atritos Para contornar os pontos de divergências, o governo francês optou por dar ênfase às coincidências na área da comércio. Os investimentos franceses na Argentina são, para o governo, o principal motivo de interesse na reunião bilateral, incluindo na área de metais críticos, já que o grupo de mineração Eramet acaba de inaugurar uma mina de lítio no país sul-americano. De acordo com fontes oficiais, os recentes anúncios de investimentos de grupos franceses no país, como a rede de supermercados Carrefour e a empresa automobilística Renault, também farão parte das conversas. Entrevista: 'Consenso no G20 criaria tabuleiro diferente para futuro com Trump', diz Tatiana Rosito, coordenadora da trilha de finanças Macron também deve tentar avançar na possível venda dos submarinos franceses Scorpène, embora a presidência francesa esteja minimizando o status das negociações. O presidente também se tornará um porta-voz da rejeição de fazendeiros e políticos quanto a um possível acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul, que inclui a Argentina. Eles temem que o acordo aumente a disponibilidade de carne latino-americana no continente e e traga a concorrência desleal de produtos que não estão sujeitos aos rígidos padrões ambientais e de saúde em vigor na Europa. Macron também deverá abordar o assunto no Rio, principalmente com os outros europeus, em particular a Alemanha e a Espanha, a quem ele deve convencer a não ignorar a oposição francesa. Além de reafirmar as boas relações entre os presidentes, que se encontraram em julho passado em Paris durante a inauguração dos Jogos Olímpicos, a agenda de Macron inclui outras questões, como a preocupação com as mudanças climáticas, algo que a Argentina minimiza, e uma homenagem aos franceses desaparecidos durante a ditadura argentina (1976-1979), gesto que contrasta com a visão de Milei sobre o que aconteceu na Argentina durante a década de 1970. Macron e sua esposa, a primeira-dama Brigitte, depositaram uma coroa de flores ao pé da Igreja da Santa Cruz, um memorial da resistência. Em dezembro de 1977, 12 pessoas, entre elas várias fundadoras das Mães da Praça de Maio e as freiras francesas Léonie Duquet e Alice Domon, foram sequestradas, torturadas, assassinadas e jogadas ao mar após se reunirem no templo. Ao todo, quase 20 franceses desaparecidos e assassinados durante a ditadura. — Não os esqueceremos — disse Macron aos parentes das vítimas que conversaram com ele, contaram suas histórias e o agradeceram pela visita à igreja. O presidente Emmanuel Macron e o presidente Javier Milei de mãos dadas na sacada da Casa Rosada, após reunião em Buenos Aires JUAN MABROMATA/AFP A homenagem foi descrita por fontes próximas ao presidente francês como "emocionante" e contou com a presença de parentes das vítimas e de organizações de direitos humanos. Por sua vez, a Casa Rosada ressaltou que a foi "uma atividade privada, não bilateral", como uma discreta tentativa de se descolar da homenagem. Na contramão de Trump: Lula e Biden anunciarão parceria sobre energias limpas à revelia de republicano Milei, assim como sua vice-presidente, Victoria Villaruel, que vem de uma família militar, foram acusados de revisionismo por organizações de defesa dos direitos humanos. Ambos defendem a teoria de que a ditadura argentina foi uma guerra em que ambas as partes tiveram igual responsabilidade e relativizam o número de desaparecidos, que calculam em menos de 9 mil, em vez dos 30 mil de consenso até agora. A recente retirada da delegação argentina da COP29 e a possibilidade de abandonar o Acordo de Paris, poucas horas antes da cúpula do G20 no Brasil, também estão em desacordo com o interesse expresso da França em cuidar do meio ambiente. A França foi uma forte promotora do Pacto Verde, uma série de recomendações ecológicas anexadas ao acordo UE-Mercosul que, por muitos anos, inclusive durante o governo de Jair Bolsonaro no Brasil, obstruiu qualquer possibilidade de chegar a esse acordo global. Aperto de mão Macron foi recebido por Milei na noite anterior com um jantar privado. De acordo com o jornal argentino La Nación, o encontro foi "agradável e descontraído", e consistiu em um churrasco. Ali, de acordo com fontes oficiais, "[a primeira-dama] Brigitte e Macron disseram explicitamente a Karina que sua visita há três semanas foi fundamental para que eles viessem ao país", acrescentaram. Janaína Figueiredo: Trump & Milei, um motivo de insônia para Lula O presidente francês saiu de um carro oficial na esplanada da Rua Rivadavia. Sorridente, Milei o cumprimentou na porta, enquanto a secretária-geral Karina Milei cumprimentou Brigitte. A saudação formal no Salão Branco durou alguns segundos a mais, enquanto o presidente explicava ao colega francês sobre o Busto da República, obra do artista italiano Ettore Ximenes, localizado atrás de ambos. De acordo com fontes oficiais de ambos os países, após o "mano a mano" entre os presidentes — que deve ser breve, já que eles se encontraram ontem à noite — haverá uma reunião com ministros e assessores de ambos os países, na sala Eva Perón. E, por fim, Macron e Milei participarão de uma reunião com empresas e empresários franceses no país, no Salon des Scientifiques. De lá, Macron partirá diretamente para o aeroporto, a caminho do Brasil. Milei voltou há poucos dias da residência de Trump em Mar-a-Lago, na Flórida, onde participou de um fórum conservador no qual propôs a criação de uma “aliança” com os Estados Unidos, a Itália e Israel para salvaguardar “o legado ocidental”, que, em sua opinião, está ameaçado pela “hegemonia cultural da esquerda”. Tanto Milei quanto Trump negam o aquecimento global e têm a intenção dar as costas aos principais acordos climáticos multilaterais. (Com AFP e La Nacion)

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