Morte de criança de 4 anos amplia lista de episódios de violência policial na Baixada Santista

Em março, também em Santos, uma cabeleireira, mãe de seis filhos, morreu com um tiro na cabeça enquanto estava sentada em uma praça O menino Ryan da Silva Andrade Santos, de 4 anos de idade, foi atingido na noite de terça-feira por um disparo durante uma suposta troca de tiros entre policiais e suspeitos no Morro São Bento, em Santos (SP), e morreu. O menino foi enterrado nesta quinta-feira (7), em um velório marcado por tensões pela presença da Polícia Militar. Um adolescente de 17 anos, Gregory Vasconcelos, também morreu durante a ação. A versão dos moradores da região, no entanto, é de que os disparos partiram apenas dos policiais e de que não houve confronto. O episódio se soma a uma série de denúncias sobre ações da Polícia Militar na região da Baixada Santista desde a deflagração de operações na região, no ano passado. Uma cabeleireira morreu com um tiro na cabeça em Santos em março, quando estava sentada em uma praça, e relatos de abusos pipocaram durante as incursões policiais. A Operação Escudo, iniciada em 29 de julho de 2023, terminou em setembro com um saldo de 28 mortos. A inicativa começou em resposta ao assassinato do soldado das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) Patrick Bastos Reis durante uma patrulha na cidade do Guarujá e resultou na prisão de 958 suspeitos, dentre os quais 382 estavam foragidos da Justiça, além da apreensão de 117 armas e de 967 quilos de drogas. Relatório divulgado pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão ligado ao governo federal que tem integrantes da sociedade civil e representantes do poder público, apontou “graves excessos no uso da força e execuções sumárias com disparo de armas de fogo” durante a Escudo. O conselho juntou 11 relatos de moradores de comunidades do Guarujá e de Santos. Segundo o documento, os depoimentos apontaram que os policiais diziam à população, quando entravam nos bairros, que “se a gente pegar com passagem, vai para a vala”. Outras pessoas afirmaram que agentes mandavam moradores ficarem dentro de casa para depois levarem pessoas até vielas vazias para serem mortas, para que não houvesse testemunhas. Testemunhas também viram um agente da Rota sendo “batizado”, quando um policial mais experiente teria mandado o policial novato matar uma das pessoas que haviam sido detidas. Depoimentos colhidos ainda citam policiais encapuzados e sem identificação na farda, destruição de câmeras de monitoramento em casas no Morro São Bento, em Santos, e recorrentes invasões a domicílio sem ordem judicial. Ao fim do relatório de 15 páginas, o CNDH recomenda que diversos órgãos federais e estaduais devem tomar medidas para evitar abordagens policiais violentas. Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) disse na época que "desvios de conduta não são tolerados e são rigorosamente apurados". Acrescentou também que a operação estava em curso para "sufocar o tráfico de drogas e combater o crime organizado na Baixada Santista". Depois da primeira incursão, o governo de São Paulo deu início a Operação Verão, que ocorreu entre dezembro de 2023 e abril deste ano e foi uma espécie de segunda fase da Escudo. Foram 56 mortos e 1.025 suspeitos presos. O governo disse que todas a vítimas fatais tinham entrado em confronto com agentes de segurança. A Verão, no entanto, ganhou novos ares após a morte do soldado Samuel Wesley Cosmo, da tropa de elite da PM, a Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), em 2 de fevereiro. A SSP chegou a transferir temporariamente seu gabinete para a cidade de Santos. Relatos de abusos e de ações desproporcionais da polícia pipocaram nas redes sociais e no noticiário ao longo dos meses de operação no litoral. Em fevereiro, policiais foram flagrados destruindo câmeras de segurança em uma favela no Guarujá. Já em março, uma testemunha da morte de Matheus Souza Santos, de 21 anos, que foi alvo de tiros no bairro do Saboó, em Santos, disse que o jovem estava desarmado e que havia gritado momentos antes de ser morto que “não trabalha na boca (tráfico)”. Um familiar do rapaz relatou ao O GLOBO que os PMs dispararam sete tiros de fuzil contra o jovem e não chamaram o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo alegou que os suspeitos entraram em confronto com os agentes. Mais uma vítima fatal dos confrontos foi a cabeleireira Ednéia Fernandes, em março, atingida por um tiro na cabeça durante uma ação no bairro Bom Retiro, em Santos. Mãe de seis filhos, ela estava sentada na Praça José Lamacchia, na zona noroeste de Santos, quando foi alvo de uma bala na cabeça. A vítima teria chegado ali depois de buscar ovos de Páscoa para seus filhos com o marido. Segundo a SSP, o caso ocorreu quando PMs patrulhavam a região e homens em uma moto em alta velocidade teriam ignorado uma ordem de parada de agentes e atirado cinco vezes contra policiais. O GLOBO esteve na praça duas semanas depois da morte. Moradores do bairro disseram que o disparo partiu de policiais. A mesma versão fo

Nov 7, 2024 - 16:32
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Morte de criança de 4 anos amplia lista de episódios de violência policial na Baixada Santista

Em março, também em Santos, uma cabeleireira, mãe de seis filhos, morreu com um tiro na cabeça enquanto estava sentada em uma praça O menino Ryan da Silva Andrade Santos, de 4 anos de idade, foi atingido na noite de terça-feira por um disparo durante uma suposta troca de tiros entre policiais e suspeitos no Morro São Bento, em Santos (SP), e morreu. O menino foi enterrado nesta quinta-feira (7), em um velório marcado por tensões pela presença da Polícia Militar. Um adolescente de 17 anos, Gregory Vasconcelos, também morreu durante a ação. A versão dos moradores da região, no entanto, é de que os disparos partiram apenas dos policiais e de que não houve confronto. O episódio se soma a uma série de denúncias sobre ações da Polícia Militar na região da Baixada Santista desde a deflagração de operações na região, no ano passado. Uma cabeleireira morreu com um tiro na cabeça em Santos em março, quando estava sentada em uma praça, e relatos de abusos pipocaram durante as incursões policiais. A Operação Escudo, iniciada em 29 de julho de 2023, terminou em setembro com um saldo de 28 mortos. A inicativa começou em resposta ao assassinato do soldado das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) Patrick Bastos Reis durante uma patrulha na cidade do Guarujá e resultou na prisão de 958 suspeitos, dentre os quais 382 estavam foragidos da Justiça, além da apreensão de 117 armas e de 967 quilos de drogas. Relatório divulgado pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão ligado ao governo federal que tem integrantes da sociedade civil e representantes do poder público, apontou “graves excessos no uso da força e execuções sumárias com disparo de armas de fogo” durante a Escudo. O conselho juntou 11 relatos de moradores de comunidades do Guarujá e de Santos. Segundo o documento, os depoimentos apontaram que os policiais diziam à população, quando entravam nos bairros, que “se a gente pegar com passagem, vai para a vala”. Outras pessoas afirmaram que agentes mandavam moradores ficarem dentro de casa para depois levarem pessoas até vielas vazias para serem mortas, para que não houvesse testemunhas. Testemunhas também viram um agente da Rota sendo “batizado”, quando um policial mais experiente teria mandado o policial novato matar uma das pessoas que haviam sido detidas. Depoimentos colhidos ainda citam policiais encapuzados e sem identificação na farda, destruição de câmeras de monitoramento em casas no Morro São Bento, em Santos, e recorrentes invasões a domicílio sem ordem judicial. Ao fim do relatório de 15 páginas, o CNDH recomenda que diversos órgãos federais e estaduais devem tomar medidas para evitar abordagens policiais violentas. Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) disse na época que "desvios de conduta não são tolerados e são rigorosamente apurados". Acrescentou também que a operação estava em curso para "sufocar o tráfico de drogas e combater o crime organizado na Baixada Santista". Depois da primeira incursão, o governo de São Paulo deu início a Operação Verão, que ocorreu entre dezembro de 2023 e abril deste ano e foi uma espécie de segunda fase da Escudo. Foram 56 mortos e 1.025 suspeitos presos. O governo disse que todas a vítimas fatais tinham entrado em confronto com agentes de segurança. A Verão, no entanto, ganhou novos ares após a morte do soldado Samuel Wesley Cosmo, da tropa de elite da PM, a Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), em 2 de fevereiro. A SSP chegou a transferir temporariamente seu gabinete para a cidade de Santos. Relatos de abusos e de ações desproporcionais da polícia pipocaram nas redes sociais e no noticiário ao longo dos meses de operação no litoral. Em fevereiro, policiais foram flagrados destruindo câmeras de segurança em uma favela no Guarujá. Já em março, uma testemunha da morte de Matheus Souza Santos, de 21 anos, que foi alvo de tiros no bairro do Saboó, em Santos, disse que o jovem estava desarmado e que havia gritado momentos antes de ser morto que “não trabalha na boca (tráfico)”. Um familiar do rapaz relatou ao O GLOBO que os PMs dispararam sete tiros de fuzil contra o jovem e não chamaram o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo alegou que os suspeitos entraram em confronto com os agentes. Mais uma vítima fatal dos confrontos foi a cabeleireira Ednéia Fernandes, em março, atingida por um tiro na cabeça durante uma ação no bairro Bom Retiro, em Santos. Mãe de seis filhos, ela estava sentada na Praça José Lamacchia, na zona noroeste de Santos, quando foi alvo de uma bala na cabeça. A vítima teria chegado ali depois de buscar ovos de Páscoa para seus filhos com o marido. Segundo a SSP, o caso ocorreu quando PMs patrulhavam a região e homens em uma moto em alta velocidade teriam ignorado uma ordem de parada de agentes e atirado cinco vezes contra policiais. O GLOBO esteve na praça duas semanas depois da morte. Moradores do bairro disseram que o disparo partiu de policiais. A mesma versão foi relatada por uma testemunha ao site Alma Preta. Segundo ela, a rua estava cheia de pessoas nesse horário, a maioria crianças. Poucos minutos após Ednéia se sentar, uma moto surgiu seguida por outras três da Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas (Rocam), da Polícia Militar. "Vi de forma muito nítida um policial apontando e atirando", disse a testemunha. Dados contabilizados pelo Ministério Público apontaram que o governo de São Paulo deixou 21 mortes provocadas pela PM na Baixada Santista de fora das estatísticas da operação Verão. A SSP contabilizou 56 mortos e o MP, 77 mortes por policiais em serviço durante os 106 dias de incursão na região. Questionada, a SSP afirma que só considerou as mortes ocorridas a partir do dia 3 de fevereiro, após o assassinato do soldado Samuel Wesley Cosmo. PMs provocam tensão e comparecem a velório do menino Ryan O enterro do menino Ryan da Silva Andrade Santos, de 4 anos, na manhã desta quinta-feira (7), em Santos, foi marcado pela intimidação de agentes da Polícia Militar. Em diferentes momentos, do velório ao sepultamento, policiais da corporação estiveram presentes nos arredores da cerimônia. Uma viatura chegou a impedir a passagem dos familiares e amigos durante o cortejo do corpo pelo Morro São Bento, onde ocorreu o assassinato. Um dos policiais apontou uma arma em direção à fotógrafa do GLOBO, Maria Isabel Oliveira, e disse: “toma cuidado”. Questionado, o coronel Valmor Racorti, comandante do Policiamento de Choque, desculpou-se pela postura do policial. O menino foi morto durante uma ação policial na terça-feira à noite. Em coletiva de imprensa, a PM admitiu que o tiro partiu “possivelmente” da arma de um policial. Ainda durante o velório, duas viaturas do 6 Batalhão de Polícia Militar do Interior se posicionaram ao lado do velório, próximo da entrada do morro. Questionados por lideranças de movimentos sociais e familiares, eles recuaram e saíram. Mais adiante, durante o cortejo, uma viatura do Choque fechou uma rua do Morro São Bento e impediu a passagem do corpo seguido das motos e carros. Ao GLOBO, o coronel Rogério Nery Machado, comandante da PM na Baixada Santista e no Vale do Ribeira, afirmou que “a viatura estava em patrulhamento naquela área, visando a segurança das pessoas presentes”. Já o coronel Valmor Racorti, comandante do Policiamento de Choque, disse que os policiais não tinham ordem para impedir o cortejo “de forma alguma”.

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